sexta-feira, 14 de outubro de 2011

Fui assaltada, graças a Deus!

Ontem terminei meu dia de trabalho trancada no banheiro de um estacionamento tentando evitar ser vítima de um assalto. Explico: assim que abri a carteira para pagar, o manobrista disse para eu me esconder, pois um cara armado estava vindo na minha direção. Como não entendi bem, o manobrista quase me jogou no banheirinho. De dentro do banheiro ainda avisei um casal que estava entrando no carro e os dois foram embora rápida e discretamente. E eu fiquei ali no banheiro pensando se o cara tinha me visto entrando ali e se viria atrás de mim. Será que ia querer o carro ou o carro e a bolsa? Coloquei o telefone para vibrar para ele não me descobrir ali caso alguém me ligasse. E se ele ficasse irritado por eu ter me escondido, será que iria atirar em mim, me bater ou até mesmo me estuprar naquele banheirinho sujo? Eu não sei quanto tempo fiquei ali trancada, mas foi tempo suficiente para eu viver o medo, na minha opinião, o sentimento mais devastador para o ser humano.

Quando vieram me chamar, a vítima, um homem que estava na porta do estacionamento que eu nem sei se estava com o carro ali ou não, ainda estava tremendo no chão. Ficou sem a bolsa ou a mochila, não sei direito. A intenção inicial do bandido mesmo, ninguém sabe e não interessa. Voltei para casa tremendo e quando cheguei e vi meus filhos dormindo, chorei muito. Muito. Só pensava em onde poderia enfiar meus filhos para protegê-los desse tipo de violência.

A vida e suas circunstâncias já nos provocam dores suficientes e inevitáveis. A morte está aí na porta para todos, as doenças são inúmeras e atingem até crianças, acidentes dentro e fora de casa acontecem, há amores não correspondidos, desemprego, desilusões, crimes passionais, suicídios, pobreza e miséria, só para dar alguns exemplos. Tudo isso eu consigo aceitar, não sem dor. Perdi um namorado aos vinte anos depois que ele pulou num lago. Minha melhor amiga sofreu um enfarto aos vinte e três anos e me deixou um buraco no peito. Amigos sofreram acidentes. Meu filho fez uma cirurgia com um dia de vida. Já deixei de ser amada. Tudo dói. Mas a violência urbana eu não consigo aceitar, eu me recuso a aceitar como um fato inevitável da vida, pelo menos na proporção em que a vivemos em São Paulo, simplesmente porque a violência urbana não é um fato inevitável da vida. É claro que ela não será extirpada, mas e reduzida? Nenhum morador de uma cidade deveria aceitar que faz parte da sua vida ser vítima de assalto, roubo, furto, latrocínio, seqüestro etc. O morador de uma cidade tem o direito de andar por ela com segurança. O tamanho da frota de carros blindados em São Paulo é uma das realidades mais tristes que vivemos! Só eu já tive pai e mãe vítimas de roubo a mão armada, irmão com carro furtado do estacionamento de um shopping, amigo que ficou sem o notebook da empresa em plena Marginal Pinheiros, amigo trancado no salão de festas do prédio enquanto trinta bandidos faziam um arrastão em todos os apartamentos, marido vítima de seqüestro relâmpago, amiga com arma na cabeça por causa da aliança, amiga com arma na cabeça por causa de um relógio e cunhada e sobrinhos na mira de armas dentro da própria casa. Eles levam nossos carros, nossos computadores, nossos relógios, nossos celulares, nossos cartões, nosso dinheiro e nossa paz de espírito e nós damos graças a Deus porque nos deixaram dois dos nossos mais preciosos bens: a vida e a integridade física.

E eu me pergunto: qual é o limite para agradecer a Deus? Se matarem um filho nosso por causa de um bem material não devemos mais ser gratos a Deus? Ou a morte é um limite muito extenso, aceitamos até que eles sofram uma lesão corporal mas fiquem vivos? E a lesão psicológica, entra no agradecimento ou não? Uma criança de dez anos que escreve uma cartinha para um amigo de outro país e apresenta a cidade em que mora como violenta, é um fato que se agradece ou não a Deus? Qual é o limite? Está dentro do nosso rol de pessoas queridas ou a gente só para de agradecer a Deus quando seqüestrarem e matarem os netos do governador, pra que ele aprenda a chefiar uma polícia? Se alguém, por favor, puder me dizer qual é esse limite, aí eu agradeço. Quem sabe conhecendo esse limite eu volte a ter alguma paz de espírito.

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