segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

SAUDADE

sau.da.de
sf (lat solitate) 1 Recordação nostálgica e suave de pessoas ou coisas distantes, ou de coisas passadas. 2 Nostalgia. 3Ornit Pássaro muito atraente da família dos Cotingídeos (Tijuca atra); assobiador. 4 Bot Nome com que se designam várias plantas dipsacáceas e suas flores; escabiosa. 5 Bot Planta asclepiadácea (Asclepias umbellata). sf pl Lembranças, recomendações, cumprimentos. S.-da-campina: o mesmo quecega-olho, acepção 1. Saudades-de-pernambuco: o mesmo que jitirana-de-leite. Saudades-perpétuas, Bot: planta da família das Compostas (Xeranthemum annuum).
É uma palavra única. Só existe em galego e em português. É também minha palavra favorita. Talvez porque eu seja tão apaixonada por essa língua que eu fico pimpona de saber que nós podemos expressar esse sentimento de uma maneira que ninguém mais no mundo consegue. E me dá um orgulho danado falar, escrever, me comunicar em uma língua que sabe como dizer saudade. Hoje é o Dia da Saudade, não sei porque. Talvez alguém precisasse institucionalizar o sentimento, ou talvez porque havia algum deputado entediado. Eu gosto de pensar que alguém amava tanto a dor daquele vazio que se instalava, sentia-se tão impotente diante da lembrança do que seus braços já não mais alcançavam; que resolveu criar um dia para sentir saudades, adicionando como regra que não se houvesse mais saudades em dia nenhum após aquele. Acontece que saudade é como fumaça de incêndio ou poluição. Inevitável, indomável, impalpável. Ela passa pelas frestas, enche nossos pulmões. Não existe como dissociar saudades do ar que respiramos. E quando faz muito tempo, já não sabemos dissociar as saudades de nós mesmos. O que mais gosto de saudade, é que ela não pode ser planejada. Ela chega, e só existe quando já é. Não se escolhe quando sentir saudades, assim como não escolhemos quando amamos o que se foi. Às vezes sinto saudades do que está bem na minha frente. É quando realizo que já não sou mais meu objeto de saudades. Então encaro a estranha no espelho e aceito que um dia também posso sentir saudades dela.

20 anos

Há vinte anos, mais ou menos nessa hora, eu recebia a notícia da morte de uma pessoa querida. Mais do que querida, amada. Uma pessoa que oito dias antes havia completado vinte anos de vida. Uma pessoa com quem brinquei, uns vinte dias antes do seu aniversário de vinte anos: vai ficar velho. Uma pessoa que me respondeu com seriedade nos olhos e na voz (tão contrária à costumeira alegria): não brinque com isso, não fale mais disso, eu não deveria fazer vinte anos. Quanta bobagem, pensei. Só pensei. No dia 30 de janeiro de 1992, enquanto esperava por ele sentada numa cadeira em frente ao mar e recebi a notícia de que ele não viria, não viria nunca mais, eu entendi. Ele não devia ter feito vinte anos.

quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Joelhos

Olhos baixos. Preto não, que ela não vestia preto. Nenhum pensamento em especial, mas evitava palavras. Olhava para os joelhos. O movimento em torno do caixão no meio da sala lhe era incompreensível. Odiava seus joelhos agora grudados e jurava que, de hoje em diante, eles lhe seriam escravos. Sentiu uma estranha cãibra no abdômen, sua coluna se curvou um pouco mais e algum desatento podia supor que ela soluçava. A respiração acelerou, a boca entreaberta e muda, os olhos fechados com força. Não tornaria a olhar para ele. A mão espremia um lenço que alguém lhe dera e ela percebeu seus mamilos rijos. As mãos agarraram a borda da cadeira estofada. O assento estava quente e os joelhos tentavam se separar contra vontade. Inútil.  Crispou o lenço e pequenas ondas vararam seu corpo. A cabeça se jogou para cima com mais energia do que seria de se esperar e os olhos continuavam cerrados. Pouco importava. Soltou a respiração forçada e lentamente enquanto os ombros cederam, a boca abriu sonora e o corpo abandonou a tensão que sustentara por um tempo. Ofegava. O caixão estava a caminho da sepultura, levando este último orgasmo.  E ela determinada a fazer dos joelhos seus escravos.

terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Astromelias

Comprei um buquê de flores para colocar no vaso em cima da mesa da sala. Um buquê de astromelias roxas que alegraram o ambiente por um par de dias. No final de semana começaram a despetalar. Engraçado que elas não murcharam, não perderam a cor. Simplesmente se despetalam aos poucos quando eu não estou olhando. Cada vez que passo por elas, recolho um tanto de pétalas mortas caídas sobre a mesa e jogo no lixinho da pia. Elas ainda parecem com um buquê, mas eu sei que os dias estão contados. Que em pouco tempo todas as pétalas ter-se-ão ido, e o que sobrará será um punhado de caules embolorados em uma água turva. Fico pensando em qual foi o exato momento que o buquê deixou de ter vida. O instante em que esse processo todo se iniciou. Aquele limite sem volta em que o vivo e vistoso condenou-se irreversivelmente ao destino árido de um vaso morto. E cheguei a conclusão que eu mesma não notei quando minha primeira pétala caiu sobre o tampo de madeira. Nesse final de semana me despetalei. Sem dor nenhuma. Como quando uma rajada de vento joga ao chão as pétalas soltas de astromelia da alma. Elas já estavam soltas, só precisavam de algo que as desprendessem. Seja o vento, seja a gravidade. Pétalas soltas caem. Agarrar-se à ilusão de que ainda são flores não vai fazer delas um buquê. Perdi a confiança em todo mundo que conheço. Não é um exagero. Perdi a confiança na minha família, nos meus amigos. Naqueles que eu tinha certeza que eram amigos. Amei tanto a beleza de um vaso florido, que nem percebi que ele não é mais vaso, não é mais flor. Ainda amo, embora não saiba o que eu ame. Não sei se amo a idéia de astromelias, ou se sou capaz de amar o lixo orgânico que elas se tornam. Confiança é uma pétala. Quando ela se desprende, nunca mais será flor novamente. É possível amar sem confiar?

segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Segunda-feira

Como chegou ao café com pernas tão bambas, não sabia explicar. Olhou para os pés, mas não encontrou as formigas que sentia devorá-los. Talvez fosse só o bafo da manhã. Talvez a fome: havia saído de casa só com angústia no estômago. Pediu uma média e um pão na chapa. O pão ela jogou na lixeira da calçada. Na média conseguiu dar dois goles. A agonia quis sair em formato de vômito. Uma gota de suor gelado despencou da testa para o colo. Tentou, mas o bom dia para o balconista não saiu. Uma família dormia na calçada. E suas crianças, onde estavam? Olhou novamente para o atendente que lhe entregara o café, mas não o reconheceu. Por um instante viu seus filhos deitados na rua e seu amor sendo jogado no lixo não reciclável. A angústia começou a gritar sufocada dentro do estômago. Tentava subir até a garganta, mas um gole no café frio deixado em cima do balcão a fez descer. Viu as portas abertas de um ônibus e entrou. Ninguém sabe para onde foi.

sábado, 21 de janeiro de 2012

Pano de chão, desinfetante, alcool e esponja

Mulher gosta de fazer as unhas no Brasil. Muito. Se nos outros países este assunto é tão sério quanto aqui no país tropical abençoado por Deus e bonito por natureza, não sei. Pode rir. Você deve ser homem.


Fiz um curso no qual o instrutor usou como exemplo uma mulher que, ao se preparar para uma reunião de negócios, lasca sua unha até o momento perfeita e passa a exibir aquela lasca descoberta, entre todas as outras unhas que ostentam o vermelho "Deixa Beijar".
A concentração vai TOOOOOODA para a maldita unha. Como disfarçar esta merda? 


E eu com isso, pergunta você meu jovem rapaz ou garboso maduro (as mulheres estão entendendo cada uma das palavaras...). Nada, eu sei. Você tem NADA a ver com isso. Mas receberá as conseqüências, eu garanto.


Se esta situação vier, após um dia no qual o objeto fálico mais próximo que a dita cuja tenha encontrado seja o rôdo, eu sugiro o silêncio. E muito alcool. Nela, claro.



quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Angel

Hoje estou ressentida. Sério. Não é um sentimento bonito, eu sei. Mas é um sentimento, e acho que a gente está na brincadeira para sentir todos os sentimentos. Então hoje é ressentimento. Mas nada que cause muito espanto. Não estou ressentida da minha infância, ou de alguém em particular. Estou ressentida sim por não ter nascido com o corpo da Gisele Bündchen, ou da Alessandra Ambrosio. Estou ressentida por sofrer bullying da balança do banheiro. De não poder comer Chocottone com chocolate extra. Verdade que não é um grande ressentimento, e futilidades costumam ter datas marcadas. Mas se uma mulher alega nunca ter se ressentido de uma Victoria’s Secret Angel, está mentindo. Ou pior. É porque seus ressentimentos são muito mais sérios. E daí vem a amargura, o desencanto. Por aqui tento manter assim. Os ressentimentos fúteis, e os amores verdadeiros e profundos.
PS.: E só para registro, já que meus amores são profundos, comunico em tom de piada interna que “se é para o bem de todos e felicidade geral da estufa, diga às avencas que fico”. ;-)

Veja?

Abro a página do Terra para acessar meu webmail e caio num erro há muito tempo não cometido: enquanto a página abre, baixo os olhos para ler algumas chamadas de notícias. Vejo um link para um vídeo com a seguinte legenda: "traficantes criam funk enquanto torturam garota. Veja."

Veja?

Veja??

Veja???

É isso que vocês jornalistas ou sei lá que raio de classe que trabalha no Terra querem que eu veja? Uma garota sendo torturada por traficantes enquanto eles criam um funk? É esse o convite que vocês me fazem? É sério isso ou será alguma piada como a da "Luiza que está no Canadá"? Um novo funk que vai invadir nossos ouvidos à la Michel Teló com seu "ai se eu te pego"? Como seria? "Vai cachorra, desce até o chão, agacha bem gostoso pra eu te dar um safanão." Ou..."eu vou te torturar, até você falar, eu vou te torturar, é capaz de você gostar."

O que eu estou escrevendo? Não sei mais, fiquei atordoada, com dor de estômago, de verdade: a comida que ainda estava no caminho encontrou um estômago embrulhado, está tudo aqui me impedindo de respirar livremente. O purê de batatas deve ter ido parar nos pulmões. Não sei. Não sei se era mesmo uma tortura filmada por um celular e jogada na rede por uma empresa ou um golpe de marketing (de extremo mau gosto). Numa semana em que se falou tanto sobre um suposto estupro no BBB425, eu já não sei mais em que e quem acreditar, até onde me espantar e por quem temer.

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

Segredo revelado

Eu tenho medo do que acontece em silêncio dentro do meu corpo (e em tantos outros corpos que amo). Criança ainda, enquanto eu procurava pela Rita Lee dentro das caixas de som na sala de casa, eu me perguntava se os médicos já haviam inventado uma máquina enorme onde eu pudesse entrar e ter todo o meu interior examinado para saber, afinal, que tudo estava funcionando conforme programado para uma vida saudável. Ou não. O que já me agoniava era o desconhecimento, a imprevisibilidade. E o pior de tudo para a minha pequena alma: a inevitabilidade. E essa aflição era um dos meus segredos. Nunca tive coragem de perguntar para os meus pais se essa máquina perscrutadora já existia. Talvez eu já tivesse a consciência de que essa preocupação não deveria estar na mente (ou no coração?) de uma menina. Então a Ita, parte babá, parte faxineira, parte cozinheira e inteira minha protetora chegava, me pegava no colo e colocava Martinho da Vila na vitrola. E a gente sambava enquanto gargalhava.

Hoje, por causa de uma dormência que se instalou no meu braço há meses, o medo saiu do silêncio.

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Esporte mundial. Reclamar.

Deve ter sido no primeiro choro. Ali, naquele instante, saímos do aconchego uterino e abrimos o berreiro: quero voltaaaaaaaaaar!!!! Reclamação marco zero.
Quem gosta do BBB, reclama do que acontece na casa. Quem não gosta, reclama dos que gostam do BBB. Política, nem me fale! Devemos estar universalmente no fundo do poço, pois nada de bom acontece nesta esfera. Se existe vida além do planeta Terra, cheio de água poluída, eles devem estar com pena de nós. E reclamando do que pode vir a acontecer, caso este planeta... puff!
Faço parte dos que reclamam. Meu marido diz que sou PhD nesta arte. Meus filhos e enteados também. Minha mãe também. Bom, meu pai já morreu então... deixa prá lá.
No dia que tenho que fazer depilação, aumentam exponencialmente as minhas reclamações. Quem foi que inventou esta porcaria? Quem disse que mulher tem que estar totalmente sem pelos? Por que precisamos passar por esta tortura... e por aí vou eu até o Instituto de Depilação Irani.
Os pormenores da preparação, vou poupar a todos. Quem conhece sabe do que falo, quem desconhece pode perguntar para a amiga ao lado. Ou para o amigo ciclista ou gay. Eles sabem como é.
Entre uis e ais, a conversa com Alê, a depiladora, vai se desenrolando. Mulher fala mesmo, até quando depila e os assuntos são muito variados. Afinal, alguma coisa precisa nos entreter naqueles 40 - 60 minutos de tortura.
Sempre levo um livro para me distrair e isto acaba chamando a atenção e o assunto "voce le muito? o que está lendo agora?" se inicia. Alê estava envolvida com livros espíritas, depois de abandonar a religião evangélica. Fico curiosa e começo a perguntar, o que houve, como foi isso, qual o problema.
Em 2011, Graça a filha de 10 anos da Alê, foi diagnosticada com um câncer raro. A doença só foi descoberta, pois Alê cismou com uma bolinha na sola do pé direito da filha que 6 médicos insistiram que era olho de peixe. Ainda bem que o 7o. resolveu ouvir mais atentamente esta mãe e descobriu o que era.
Graça perdeu os lindos cabelos negros. Alê ganhou uma força que disse nunca ter conhecido antes.
Quando terminamos o papo e a depilação, emocionada Alê me disse: "E voce acredita que minha filha nunca reclamou?"
Fiquei envergonhada.

E no almoço de ontem

Um homem na faixa dos sessenta, negro com alguns fios de cabelo brancos, barriga pouco saliente e grossa aliança de ouro na mão esquerda, confessa para o amigo:

Lá consegui arranjar umas três namoradas, mas é muito difícil, não sei se você me entende. As mulheres só gostam de romance, não querem saber de aventura. Uma que arranjei era boa, sabe, mas já era uma senhora com quarenta e poucos anos, viúva e mãe de um filho com vinte. Desde que o marido morreu não tinha namorado, então queria uma coisa mais séria, é difícil. E depois era de uma família quatrocentona da Mooca, ficou muito complicado, você me entende?

Não sei se o amigo dele entendeu, mas eu não compreendi a parte que as mulheres não querem saber de aventuras, nem a da senhora com quarenta anos e menos ainda a família quatrocentona da Mooca, de onde vem parte da minha família.

E para a jovem mulher romântica da Mooca, fica o meu recado: a vida será bem melhor sem ele. Bem melhor.

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

16 de janeiro de 2012.

Hoje estou um pouco triste. Passei o dia vendo tantas notícias tristes na internet. Trabalhei tanto que meu ombro dói. Tentei parar às 19h, mas só consegui às 21h. Só coisas feias acontecendo. Então já não tinha forças para escrever mais nada. A pia ficou cheia de louças, porque eu não tinha forças para lavar. O escritório ficou uma bagunça, porque eu não tive forças para colocar os papéis em seus devidos lugares. Nem todos os emails foram respondidos. Nenhum livro foi lido. Nenhuma frase escrita. Mais pessoas dirigindo bêbadas. Mais mulheres sendo tratadas como lixo. Mais crianças sucumbindo às drogas nas ruas. Mais cinismo em todas as relações. Eu geralmente vivo em um mundo cheio de amor. Acredito que as coisas vão melhorar sempre, que existe beleza no mundo e que a natureza humana é de bondade. Mas hoje... hoje estou triste. As coisas feias do mundo conseguiram tomar mais minha atenção do que o resto. E quando isso acontece não sobra muita energia para nada.

Bom dia, São Paulo

O primeiro calor do sol já encontra milhares de pessoas nas ruas. Indo para seus trabalhos nas ruas, empresas, escritórios, casas, lojas, postos de gasolina, farmácias, supermercados, restaurantes, padarias, bares, lanchonetes, copiadoras, bordéis, escolas, salas de aula, igrejas, shopping centers, hospitais. Outras voltando de seus trabalhos ou festas ou encontros. Celulares nas mãos com dedos frenéticos no teclado. Um bom dia para quem está distante. Uma espiada na vida do outro. Todos nos expomos. O metrô sem condutor já está no seu caminho roubando o espaço das formigas e cupins. O rapaz reclama da Paulista. A mocinha do Brás. Todos querem dinheiro, de preferência em troca de pouco trabalho. Um café para viagem com um pão de queijo, por favor. Zumbis com seus cobertores pelas calçadas. A maior frota de carros blindados. Todos sentimos medo. Quero tatuar a coragem na minha pele. Das mãos ou dos pés?

domingo, 15 de janeiro de 2012

Maria Dilma, quase uma lady

Depois de quase dois anos morando na Alemanha, volto para Vila Madalena, São Paulo, Brasil.
Confesso que não queria. Ficava assustada pensando na possibilidade da minha loirinha de apenas três anos ser seqüestrada à tarde em um shopping center lotado. Deixava uma cidade com aproximadamente cem mil habitantes, retornando à cidade dos milhões. Milhões!

Não é fácil se acostumar com idioma diferente, cheiros e sabores estranhos, neve na entrada de casa que você mesma limpa, sistemas super organizados ou não conseguir comprar o pãozinho para o café. É muito fácil se acostumar com a sensação de segurança, espaços bem cuidados, andar de bicicleta por todos os lados, abdicar do carro pois a cidade é plana e pequena, ter o marido de volta em horário regular e ainda aproveitar o tempo livre durante a semana com a família. É isso mesmo, DURANTE a semana.

Tudo isso estava ficando para trás e o que vinha pela frente, precisava de ajuda. Eu precisava dessa ajuda, pois voltar a trabalhar estava nos meus planos. Vamos contratar a empregada doméstica antes que o container desembarque a nossa mudança. Estávamos em mil novecentos e noventa e quatro.

Como ela apareceu, eu não me lembro. No Brasil, todo mundo tem alguém que pode indicar outro alguém para trabalhar. Um dia, tomando café no posto de gasolina perto de casa, a conversa entre o senhor de cabelos brancos e a atendente do Select já estava avançada nas tratativas de contratação. A loja estava prestes a perder uma funcionária. Minha mãe não é agencia de empregos e muitas vezes a consultam quando se trata de obter ajuda doméstica. Se voce frequenta sempre o mesmo supermercado, conhece desde o caixa até a pessoa que te ajuda com as compras, garanto que esta é uma boa fonte de contatos. A santa Luzia que trabalha para mim hoje em dia, veio direto de uma indicação no Pão de Açúcar. Esta mulher também é digna de uma crônica. Terá seu dia aqui no blogue.

Cento e quarenta e sete centímetros, vinte e sete anos e aproximadamente cinquenta quilos, com os quais vivia em briga constante. Cabelos crespos, alagoana, libriana, fumante e, de acordo com ela mesma, quase uma lady. Maria Dilma, muito prazer.

Sempre muito direta e clara, de criança e cachorro não cuidava, não dormia fora de casa e não gostava de se envolver na vida "dos patrões". Cozinhava "o normal" e queria os finais de semana livres. Perfeito, estava na medida para as minhas necessidades. Este foi o nosso começo, em um pequeno apartamento na rua Purpurina, com dois quartos, um casal, uma criança e nenhum cachorro.

Adorava um papo. Boa de prosa mesmo, atracada com a vassoura ou com uma pilha de roupa para lavar e passar, quem desse trela a ela tinha dificuldade de se despedir. Dilma passava de um assunto a outro facilmente, sem dar espaço para o interlocutor concordar, discordar ou ainda ter opinião. Ôxi... era a deixa para algum comentário. E que fosse feito rápido.

A "quase lady" tinha um sonho. Queria voltar a estudar e fazer faculdade de assistencia social. Saiu muito cedo de Alagoas para tentar, como tantos, a sorte na cidade grande. Também queria deixar para trás a triste vida, as brigas com o pai, a mãe que não se manifestava e o espaço que era pouco.

Treze anos se passaram desde o primeiro encontro. Dilma cuidou de criança, depois cuidou de duas crianças e um cachorro, dormiu fora de sua casa, participou de um divórcio e de um novo casamento, mudou de casa comigo três vezes até que o seu sonho pulsou fortemente, não permitindo mais que fosse adiado. Tchau Dilma, até a próxima.

Mantivemos contato por telefone, Natal, aniversários ou apenas para fofocar. Continua sendo difícil desligar o telefone quando nos falamos, ela ainda fala muito! Foi por telefone que fiquei sabendo que ela concluiu seus estudos graças ao supletivo, prestou duas vezes o vestibular para assistência social, entrou na faculdade e passou direto em seu primeiro ano como universitária.

Depois de quatro anos sem nos encontrarmos, hoje foi dia de uma cervejinha com a Baixinha. Ela voltou à nossa casa - misto de trabalho e lazer - com a família  reunida e colocamos todos os assuntos em dia e a saudade cedeu um pouco.

Se o valor de uma pessoa pudesse ser medido em números, a soma deste texto ainda ficaria devendo à Baixinha, que é muito mais que uma lady.

Toda a gente diferenciada

Já era 1h da manhã quando eu voltava para casa depois de um jantar e um longo papo com minha melhor amiga. Parei no farol da esquina da Angélica com a Sergipe. A mesma esquina da polêmica estação de metrô. A esquina do Pão de Açúcar e da "gente diferenciada". Na porta do supermercado estava sentado um bêbado segurando um copo de plástico. Ele estava encolhido, quase imperceptível, talvez na tentativa de chamar o mínimo de atenção e não ser enxotado da calçada. Pela porta saía um grupo animado de jovens. As meninas vestidas com saias curtinhas, brilhavam sob a luz pública, reluzindo glitter e gloss importado. Os rapazes, todos com os cabelos impecáveis. Exibiam músculos perfeitamente esculpidos dentro das mangas de suas camisetas brancas e coloridas. Ao fundo do grupo um rapaz loiro, com feições um pouco arrogantes, um pouco audaciosas. Feições que esses meninos "não-diferenciados" todos exibem antes de entrar em seus  carros e dirigirem para clubes e discotecas. O menino loiro carregava uma garrafa de vodka. O mendigo estendeu o copinho de plástico pedindo um pouco da bebida. Me surpreendi com a prontidão com que o rapaz parou para atender o bêbado. Arrancou o lacre da garrafa, jogou no chão da calçada, e com esforço tentou abrir a garrafa. A garrafa não abria. O mendigo estava com os olhos fixos no rapaz, quase não respirava, com seu copo de plástico aguardando uma dose de anestésico. O rapaz olhava para os amigos. Tentava abrir a garrafa ignorando completamente a pessoa para quem se disponibilizava ajudar. Ele tentou. Tentou. A garrafa não abria. Então o rapaz loiro desistiu. Virou as costas e seguiu o grupo de amigos. Sem dizer nada. Sem se desculpar. Sem dar uma satisfação. Ele foi embora sem nem se dar conta de que o copinho de plástico continuava no ar esticado, e que a expressão no rosto do bêbado era de um desolamento de cortar o coração. Meu farol abriu mas eu estava tão chocada com a falta de respeito que eu havia testemunhado, que não segui. Dei ré, encostei na calçada e tirei a primeira nota que encontrei na carteira para o bêbado. Ele se assustou a princípio, mas depois pegou o dinheiro e me agradeceu. Me agradeceu diversas vezes, e continuou agradecendo a Deus e me acenando sorrindo mesmo depois, quando eu já estava com o vidro insulfilmado levantado, esperando mais uma vez o farol abrir na esquina diferenciada. Uma parte de mim se sente responsável por todo sofrimento e pelo dano que a bebida que aquele homem comprar com o dinheiro que eu dei possa fazer. Uma outra parte simplesmente não consegue ver uma pessoa ser ignorada e tratada como lixo. Tanta polêmica por dizerem que as pessoas são diferenciadas. Eu só vejo pessoas.  Algumas agradecem a Deus, outras viravam as costas incapazes de olhar nos olhos daqueles a quem se dispuseram a ajudar. Naquela calçada só havia pessoas, e todas buscando serem anestesiadas.

O consertador de almas

Por que estou aqui?

...

Eu estou aqui não porque meu casamento rachou com a batida da porta, nem porque tenho medo – não, medo eu tenho de perder o emprego e de encontrar patinhas de barata na comida do restaurante; o que eu sinto é pavor, uma indizível estremeção de ter que enterrar um filho, e nem estou aqui porque me pergunto todos os dias, e se chover?

Eu estou aqui por causa da bolha que habita o meu estômago e de quando em quando se expande até a garganta e os dedos dos pés e das mãos, me amaldiçoando por eu ter apenas esse espaço para oferecer. Mas existem pernas e braços infinitos?

E quando sua inconformidade atinge a loucura, ela sobe para a minha cabeça e se autoinflama, como uma criança que desejasse ganhar o prêmio pela maior bolha de sabão já feita, soprando até o limite para não estourar, o espaço exato onde nenhuma gota de ar a mais caberia.

Eu fico como um balão perdido sobre os homens, aterrorizado com o azul que não está acima de nós, jogado pela ilusão a todos os cantos de uma cidade que não reconheço, gritando numa língua que ninguém decifra, até a bolha se autoesvaziar e me dar um pouco de tempo na concretude em que também não me encaixo.

Comecei com chá de hortelã e de folha de maracujá, passei para Maracugina e passiflora. Divã, quatro paredes e nenhuma palavra solta. Lexapro e Rivotril. Uma poltrona, dois olhos em mim e os meus na janela. Estou cansada estou cansada estou cansada – só tenho essas palavras que ninguém entende para dizer. Ansiolíticos debaixo da língua e dentro da veia. Alimentei a bolha com ar e cinzas.

Em nenhuma dessas caixas e cômodos encontrei o homem do conserto. E hoje, ele veio?

sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

O jornaleiro

Eu passava em frente à banca todas as manhãs a caminho do trabalho. Nem sempre comprava, mas o “bom dia” para o jornaleiro era sagrado. Um dia ele me ofereceu uma revista emprestada, para ser devolvida depois de lida, e quis fazer disso um hábito, o que eu não permiti. Semanas mais tarde me presenteou com uma tábua e um cortador de pizza que ele mesmo havia feito. Também era marceneiro. Depois foi uma caixinha para guardar pequenos trecos. Levei meus cachorros para ele conhecer, o marido e meu primeiro filho, cujo crescimento na barriga ele acompanhou.

E numa manhã ele não estava. Nem na seguinte e na outra. O novo jornaleiro, sisudo, não soube me dizer seu paradeiro e nem um “bom dia”. Mudei de calçada.

Ano passado, em Parati por ocasião da Flip e quase dois anos após o sumiço do jornaleiro, resolvi comprar uns doces vendidos nas ruas por ocasião da festa de Santa Rita. O pagamento deveria ser feito ao senhor ali no caixa. Entrego o dinheiro ao homem de cabeça baixa que só a ergue para me dar o troco. Sim, ele. O jornaleiro havia virado caixa em homenagem a Santa Rita. Não, não era bem isso, ele me disse. A família era de Paraty e ele resolveu voltar para seu lugar de origem. Todos os moradores, ou quase todos, ajudavam na festa e ele estava fazendo a sua parte. Foi uma alegria o nosso encontro, mas não consegui vê-lo no dia seguinte, como combinado.

Hoje me lembrei dele. Não porque vi a tábua e o cortador de pizza na cozinha, mas porque parei numa banca de jornais para comprar a Bravo deste mês. O jornaleiro me vendeu o último exemplar. Ficou feliz por causa disso e me deu um Trident de presente. Que bom. A banca está no meu novo caminho.

quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

Enquanto isso...

No metrô, em São Paulo, um jovem na faixa dos vinte anos e uma mulher com mais ou menos sessenta estão sentados lado a lado:

Ele: Então, sabe quando você passa quatro dias grudado numa pessoa e depois não aguenta mais olhar para a cara dela?
Ela: Ah, sei.
Ele: Foi isso que aconteceu. Não é que eu não goste mais dela, eu só não aguentava mais olhar para ela depois de quatro dias. Ai, eu precisava respirar, dar um tempo. Ela não entendeu, ficou chateada, mas eu vou ligar para ela. Não é nada demais. Você me entende?
Ela: Entendo, sim, mas é bom a gente ligar para as pessoas, dar atenção, mostrar que gosta delas. Você viu o que aconteceu com a minha irmã?
Ele: Ah, e ela, como está?
Ela: Hoje piorou, voltou a ser entubada. Ontem ela jantou sozinha, perguntou sobre um monte de gente, conversou, mas não aguentou muito tempo. E ela é tão forte, mais saudável que eu, veja só.
Ele: Mas faça pensamento positivo que vai dar tudo certo. Você acredita em Deus?
Ela: Como assim? Sabe por que eu respiro? Por causa de Deus.
Ele: Então ela vai ficar bem.

Uma voz anuncia a Estação Brigadeiro.

Ela: Eu desço aqui.
Ele: Foi um prazer te conhecer.

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

A asa quebrada

Ela resolveu escrever uma carta à mão em homenagem aos cinquenta anos dele. Já havia passado mais de vinte aniversários ao seu lado e não se lembrava de quando havia escrito a última carta com papel e tinta. Escolheu uma seda amarelinha comprada em Paris e guardada numa gaveta para uma ocasião especial. Não sabia se aquela era realmente uma ocasião especial, mas como nunca saberia com antecedência, colocou o papel sobre a mesa de jantar, inspirou fundo e ouviu o silêncio da casa.

Começou com “meu querido”, já agradecendo pelos anos de convívio, pelas velas que já apagaram juntos, pelo companheirismo e pelo filho que fizeram e criaram até o dia em que ele completou dezenove anos onze meses e vinte e dois dias de vida. Se precisasse, ela não saberia explicar como ainda vivia com alegria, mas o abraço dele, sempre quente, naqueles momentos em que seu único desejo era um descanso eterno, com certeza a ajudava.

Agradeceu pelo apoio no segundo momento mais triste da sua vida, quando perdeu seus seios para uma doença perversa que até hoje a faz duvidar da existência de Deus, e achou desnecessário recordar a mágoa que ainda guarda por ele não ter tido força para resistir a dois peitos perfeitos justamente quando ela ainda não conseguia ficar nua nem na frente do espelho. Ela chegou a compreender, mas compreensão não acaba com dor. Nem alivia.

Mas um dia ele voltou a tocá-la e ao invés de prazer ela sentiu gratidão, que passou a alternar com a raiva, que por sua vez foi aparecendo em espaços de tempo cada vez mais longos. Ela ainda aparecia, mas hoje já sabia despistá-la.

Decidiu lembrá-lo de que ele ainda era a sua escolha, reafirmada diariamente com o bule de café que ela deixava preparado logo às seis da manhã, enquanto ele saía da cama para tomar banho.

Terminou desejando-lhe um feliz aniversário e antes de assinar a carta sentiu que deveria escrever um “eu te amo”, mas não conseguiu. Ela havia falado em dor, alegria e esperança, como poderia reduzir tudo o que havia escrito e vivido com ele num “eu te amo”? Então não era óbvio que ela o amava, se o amor é cuidado, compreensão, empatia e entrega? Fala-se tanto sobre o amor que chegou a duvidar que conhecesse seu significado. Se amor era o que a mantinha nesse casamento, o que ela sentia pelo filho, por uma árvore plantada no quintal da sua casa e pelo cachorro que dormia aos seus pés, como era possível que fosse simbolizado numa só palavra? Ou, na verdade, ela simplesmente não conseguia escrever “eu te amo” porque o amor pelo marido havia se transformado em hábito? E se era isso, não é possível amar um hábito? E alguns hábitos não viram hábitos porque repetimos aquilo que amamos?

Soltou a caneta e levantou os olhos para o tempo. Lembrou-se da xícara herdada de sua avó, envolta num pedaço de feltro no fundo do guarda-roupa, porcelana Rosenthal branca com detalhes de flores azuis e filetes de ouro, único bem material que sua avó conseguiu esconder dos nazistas e que chegou do outro lado do Atlântico com a asa quebrada. Sua avó gostava ainda mais do objeto que fora de sua mãe perdida na guerra por causa dessa imperfeição. “Isso é a vida, minha neta. Ninguém passa por ela sem uma mutilação, nem mesmo as xícaras”. No dia em que a avó morreu, antes que qualquer parente percebesse, a xícara já estava escondida no seu guarda-roupa. Nos momentos de angústia ou aflição, era para aquele objeto de adoração de três gerações que ela olhava. Quando a vida do seu filho foi interrompida, foi olhando para a xícara de asa quebrada que ela rezou com os dois joelhos no chão.

Colocou um pouco de água para esquentar e desembrulhou a xícara mais uma vez. Sempre que fazia isso passava a ponta dos dedos pelas flores e pela borda dourada. Olhou para ela com os olhos doídos e o coração vazio. Esquentou-se com um chá de camomila e voltou para a carta interrompida, onde escreveu, antes da sua assinatura, “eu te amo”.

sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

O QUE HÁ EM COMUM ENTRE UM TÊNIS E UM NOTEBOOK?

Tecnologia? Globalidade? Imagem de marca? Claro, tudo isso.
Mas não é disso que quero falar. É sobre outras coisas que sabemos, mas talvez não pensemos muito a respeito.
Que tal pensar que o preço de um tênis de alta tecnologia e um notebook de configuração decente custam a mesma coisa? E que o impulso, a sede nos olhos, a faca nos dentes para comprar também são iguais?
A madrugada de hoje foi povoada por enormes filas em alguns locais, constituídas por pessoas ditas comuns, todas com o mesmo propósito. Comprar ingressos para um grande show? Não. Simplesmente gente que queria aproveitar a grande liquidação de eletrodomésticos e eletro eletrônicos que algumas cadeias de varejo marcaram para este dia, oferecendo descontos de "até" 70%. Geladeiras, micro ondas, máquinas de lavar, computadores, jogos, TVs e muitos outros, liquidificando as mentes numa ideia fixa coletiva.
Apressados diriam que é mais uma demonstração da nova classe C. Que nova o que! Desde quando a expansão de crédito motivada pela necessidade dos bancos botarem o dinheiro para trabalhar quer dizer mudança no jogo social? Mas este não é o ponto.
A fissura com a qual as pessoas permaneceram na vigília quase religiosa nas portas do Magazine Luiza não difere daquela do grupo que passa a noite à porta das lojas Apple em todo o mundo para comprar o novo modelo de iPhone ou qualquer outra novidade.
Voltando ao preço, pense em Adam Smith percebendo que é necessário o mesmo volume de moeda para comprar um tênis Mizuno de alta performance e um laptop Dell já com sistema operacional incluso. Como ficaria naquela mente brilhante a grande Revolução Industrial?
Parece que é isto que os filósofos queriam dizer quando falavam que devemos buscar Roots and Wings. Um bom tênis para os pés e um computador para as cabeças.

quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

Tal pai, tal filha

Em Cuba, uma pessoa está pedindo ajuda para nossa governante suprema para pode vir ao Brasil. Vou lá e dou um palpite.
Do Rio, tem um pessoal engraçado pacas, até lançaram livro e me divirto com o mau humor deles. Vou lá e devolvo um kkkkkk.
Um Titã posta seus versos infantis e outro suas participações em videos. Vou lá e leio. Vou lá e assisto. E digo se gostei ou não. Assim, de chofre.
Em Sampa pré campanha eleitoral, políticos tradicionais ou não, comunicam a que vieram. Vou lá e reclamo do pouco incentivo à cultura, comento sobre o teatro abandonado na zona leste.

Vou lá, sem sair do sofá. Preciso apenas de uma conta de telefone, para ter acesso ao serviço de internet, um computador ou celular e ponto. Vou lá e falo com eles.

Se meu pai fosse vivo, seria um viciado no Twitter e no Facebook. Assim como eu.

segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

Lembrete para mim

O boliviano que pedia informações para o policial na Paulista, o engravatado apressado que quase atropelou o carrinho das crianças, a gostosa decotada que sorria para o colega de trabalho, as três amigas que conversavam sobre a nova chefe, o mendigo que acordou com o barulho do caminhão, o gari que limpava o que restou da festa - além das histórias, o vendedor de sucos, o dono da livraria, a senhora que não sabia onde ficava a Pamplona, o jornaleiro sério, a faxineira sorridente. Todos querem a mesma coisa que eu.