quarta-feira, 30 de novembro de 2011

30 de Novembro de 2011.

Uma das maiores descobertas que tive na vida foi de que a gente só conquista liberdade quando estabelecemos limites. É. Meio antagônico. Mas juro que funciona. Fiquei pensando hoje de manhã nisso, enquanto eu tomava café e assistia o Renato Machado conversar comigo de Londres. Eu tenho um paladar bem próprio. Embora eu seja uma avestruz na arte de explorar sabores, tenho minhas predileções confortáveis que posso comer todos os dias. Sou bem conservadora, no fundo. Café da manhã para mim sempre foi: café com leite, pão com manteiga, mamão papaia e suco de laranja. Algumas variações como: requeijão ou geléia, aveia e mel na papaia, ou trocar o pãozinho fracês (nham, nham) pelo integral podem ocorrer. Mas no geral, esse é o café da manhã perfeito para mim. Então um dia o médico diz "sem lactose, sem glúten, sem corantes, sem morangos". (Morangos???) E o que sobra são todos os sabores que eu perdi enquanto estava ocupada demais com os mesmos sabores. Redescobri o arroz. E umas 532 diferentes formas de comê-lo. O mesmo com o milho. Ganhei o leite de soja. Eu torcia o nariz, não achava que combinava. Mas não é que fica melhor no cappuccino do que o leite de vaca!? Grão de bico, soja, quinua. E sinto sabor de infância todos os dias fazendo muito mais sucos naturais do que consumindo os de caixinha. Mas a maior de todas as conquistas: a tapioca! Livre de glúten, sempre me dá a sensação de café da manhã da pousadinha de Canoa Quebrada no meio de Pinheiros. Ando saltitando pelas pradarias dos cafés da manhã nunca dantes explorados. Isso é tanta liberdade, que até me esqueço dos limites que me colocaram.

terça-feira, 29 de novembro de 2011

Talita

Eu sempre penso na Talita.

Conheci a Talita quando passei alguns meses numa escola estadual da capital de São Paulo gravando com a TV Cultura para o MEC. Ela era uma das alunas-personagens.

Baixinha e gorduchinha, a moreninha baiana nos disse uma vez que não sabia falar a língua dos baianos. Como é que é, Talita? Aquela língua assim: ó xente bixim.

Da Bahia ela só lembrava do mar e de que o mar era de todos. Sabia, tia, que o mar não tem dono, que entra nele quem quer?

Ela estava ansiosa para a festa de encerramento. O ministro da Educação vem mesmo, tia?

No dia da festa ela não apareceu. Cadê a Talita? Cadê a Talita?

Implorei para que a diretora me passasse seu endereço e encontrei a Talita numa vilinha bem pobre andando de bicicleta.

"Eu não queria falar 'tchau'", foi o que ela me respondeu.

As cenas mais lindas que já vi

1. Meu marido me esperando no altar
2. Minha bernese puxando meu bernese desesperado da piscina
3. Meus filhos chegando no mundo
4. Um vira-lata sentado na esquina esperando seu companheiro-mendigo caminhar uns três quarteirões
5. Meus filhos entrando juntos no meu quarto hoje de manhã

segunda-feira, 28 de novembro de 2011

28 de Novembro de 2011.

Hoje eu usei a palavra "convescote" duas vezes. Uma para enviar email para as avencas. Outra, já no final do dia. No aniversário de uma amiga estávamos discutindo porque as pessoas não fazem picnics no Brasil. Então eu propus que a gente organizasse convescotes mensais para avaliar os parques da cidade dentro da modalidade. Qual não foi a comoção despertada pela palavra: con-ves-co-te. Fiquei surpresa por um grupo até grande, até culto, de pessoas não fazerem ideia de que palavra era aquela. Pediram para repetir, o que fiz diversas vezes. Algumas rápidas, outras pausadas, desenhando as sílabas no ar. Houve concurso de soletração, e para que não houvesse mais dúvidas, peguei a caneta hidrográfica e escrevi na mão: CONVESCOTE. Verdade que o picnic já foi incorporado à lingua portuguesa e hoje atende por "piquenique". Mas eu cresci sabendo que convescote era a palavra certa para designar uma refeição coletiva feita ao ar livre onde cada membro contribui com uma parcela dos alimentos. Agora, chegando em casa, fui verificar no dicionário. E não é que convescote virou sinônimo?

Datação1889 cf. AGC

Acepções
 substantivo masculino 
Regionalismo: Brasil. Estatística: pouco usado. 
piquenique 

Etimologia
voc. forjado por Antônio de Castro Lopes (1827-1901, filólogo brasileiro) de conv(ívio) + 1escote

Sinônimos
ver sinonímia de piquenique

Adverbio do cotidiano

Sempre respiro.
Todo dia me deito.
Raramente me exercito.
Nunca como jiló.
A qualquer momento, posso mudar meu caminho.
Já morei em outro país.
De longe, todos são normais.
Gosto de ficar à toa.
Às vezes não sou feliz.
Amanhã, é outro dia.


Estava à caça de um lugar para trocar baterias de
relógios e encontrei este quase quiosque, do Seu Ismar, em Pinheiros. Parede
cheia de cucos de todos os tipos, espaço mínimo para trabalhar, mãos precisas
que não olham para pegar a ferramenta. Diferencia as chavinhas de fenda no tato
e reconhece a certa só de ver o relógio. Respondeu com segurança que poderia
trocar todas as baterias, lógico, independente da marca.
Fiquei olhando, encantada, sem perceber o tempo passar. O
filho dele, Rafael, garotão com cara de 19 anos, aliança brilhando na mão
direita, está lá claramente como aprendiz. O pai pega um relógio, examina,
chama o filho e diz "este você faz", e entrega o serviço facinho ao
garoto, que desajeitadamente abre e troca a bateria. Impaciente mas educado,
fico pensando o quanto ele escolheu este trabalho. Enquanto isso, o pai vai
trabalhando os mais difíceis. "É, este aqui é China, os outros são todos
bons". "Este não tem ponteiro de segundos, precisa esperar para ver
se o minuto muda", revela. Pega o próximo, tira os óculos, coloca o óculo
de alumínio no olho, examina o parafuso. A mesinha, as ferramentas, as gavetinhas
de guardar pecinhas devem ter a mesma idade do exercício dele, 30 anos.
Seu Ismar mostra orgulho e amor
no que faz, é uma delícia.

Lembrete para Margarida

Ah, minha querida, vá ser bonita, vá...

sábado, 26 de novembro de 2011

Sábado de Noemi

Jantares como aquele não eram novidade. As mesmas pessoas, o mesmo restaurante, os mesmos pratos. A diferença estava no sorriso. E só no dela...
Claro que já tinhamos visto seu sorriso em outras situações - em seu próprio casamento, nas festas de final de ano ou com a piada besta contada no churrasco. Aquele era novo.
Suas mãos insistiam em fazer malabarismos e piruetas, sorrindo junto com os lábios. Até os cabelos, quando balançavam, sorriam...

Isto sim é felicidade, pensei. Ultrapassa a fronteira do corpo, se espalha ao redor e marca um momento. Único.

Com este sentir, acordei no dia seguinte e sorri.
A sexta, foi de Celina...
Hoje, será um sábado de Noemi...


26 de Novembro de 2011

Ando pensando em amigos, pessoas na nossa vida. Quem vem, quem vai. Sobre nossa dose de responsabilidadde sobre cada um deles. Sobre qual nossa parcela de culpa e irritabilidade.
Ando pensando na forma bizarra que o ser humano tem de viver. Na necessidade quase desesperada de relação, interação, comunhão. Na frágil singeleza do ser. Ando pensando o quanto as importâncias dadas são virtuais. E como são efêmeras as colunas de estrutura de nossos papéis, que são concreto puro dentro do que projetamos e necessitamos nos agarrar, mas que tão surpreendentemente ruem e desmoronam como glacê de bolo colorido na saliva de uma criança. Ando pensando em crianças. Na brutal inocência da criança. Na violenta autenticidade de caráter e plenitude de uma criança que senta nos degraus da escada e espera sua vez de brincar. Ando pensando, porque é exatamente isso que me abate. Ando pensando em algodão-doce.  

sexta-feira, 25 de novembro de 2011

25 de Novembro de 2011

Fiquei assustada, óbvio. A gente não recebe esse tipo de coisa assim...
Vou começar a mentir o número de horas que trabalho por dia. Minha irmã está fazendo uma lista de colegas antroposóficos e psiquiatras homeopatas. Por que será que todo mundo sempre acha que eu preciso de um psiquiatra?
Estou na condicional. Tenho de mandar relatórios diários e prometer parar a cada 3 horas. Eu vou mentir. Lógico. Todo mundo mente nessas coisas.

Cenas de uma manhã humana

Na mesa atrás da que eu estava sentada, um grisalho engravatado fala para outro não engravatado:

Passe tudo para o seu nome, se separe da sua mulher, emancipe a sua filha e não deixe rastro algum.

Já na rua, pensativa, uma grisalha que não está grisalha chora e um policial segura a sua mão.

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Parsifal, muito prazer

Quem procura, acha.
Pode até ser que voce não entenda o que encontrou, mas está lá. Pediu? Levou!
Deve ser o que chamam de "universo conspirando a favor". Dá um pouco de medo, imaginar que tudo isso, acima das nossas cabeças e que continua até sei-la-eu-onde, conspire a favor. Já pensou se conspirasse contra?
Deve ter sido por causa de uma conspiração deste tipo que ele apareceu.
Bonitão, loiro - parece que até aquele momento ninguém era tão bonito quanto ele - herdeiro de reinos e honras. Um verdadeiro cavaleiro, à moda antiga mesmo. Só ele não sabia disto. Ainda.
Mãe superprotetora - até aqui, nada novo - em um momento de sua vida, nosso jovem rapaz resolve abrir suas asinhas. Mãe tem que ter limite. Se não tem, os filhotes pulam fora. Foi o que ele fez.
Tolo, como deve ser um jovem, iniciou seu caminho de libertação montado em algo que muito dificilmente chamariam de cavalo. O bicho era um horror...
Pocotó aqui... pocotó acolá, essa historia que dura anos e anos de estrada teve de tudo: coragem, traição, bruxas, fadas, arrependimento - todos os ingredientes para uma novela das oito. Ou das seis.  Detalhes mais minuciosos, o Google pode contar.
Agora, prá desvendar... o esforço terá que ser maior.
Parece que estou no início desta jornada...

24 de Novembro de 2011.

"O nome do que você está é Síndrome de Burnout", disse o terapeuta.

Margarida

Ela não gostava do seu nome. Achava que não combinava com sua pele ainda sem uma ruga. Suas xarás já eram tias-avós, na escola seu nome era pronunciado pelos colegas acompanhado de um risinho ou com uma voz de pato esganiçada. Pensou em se dar um apelido, mas não gostava de Marga ou Guida. Queria mesmo era se chamar Beatriz para poder ser Bia. Soava tão bem aos seus ouvidos: Biii...aaa.

Sua mãe escolhera o nome em homenagem à flor, seu pai não se opôs, apesar de preferir as orquídeas. “Margaridas são tão comuns”. Ela mesma não sabia qual era sua flor predileta, talvez nem gostasse de flores. Preferia os gatos que se enroscavam nas suas pernas e pediam por água e comida. Para piorar, era feia, e toda mulher com nome de flor tem a obrigação de ser bonita. Seu cabelo ficou indeciso entre o liso materno e o crespo paterno. Não era loira como a mãe nem morena como o pai. Os olhos castanhos ficavam levemente verdes sob a luz do sol, mas faltava um brilho, já tinha até perguntado para a mãe se não teria catarata. A mãe mandou a menina passear. E para piorar ainda mais, as espinhas tinham deixado marcas não só no seu rosto, mas também em todo o seu colo. Que espécie de margarida era ela? Um bem-me-quer que parecia terminar em mal-me-quer. Enquanto as amigas choravam pelos primeiros namorados, Margarida lia os romances da Danielle Steel, escritora preferida da sua mãe, e acompanhava a novela das nove com aflição até o capítulo final. Por que as mocinhas sofriam tanto para se casar com o galã? Dos romances se interessou por poesia, aprendeu a recitar algumas, em voz quase inaudível, e conquistou o sorriso de um colega que gostava do mesmo poema que ela.

No final da adolescência, algumas flores secas de Margarida caíram, o caule cresceu um pouco mais e tomou uma forma robusta, de planta madura que floresce quando a natureza determina e não quando quer. Do colega ganhou o primeiro beijo e o primeiro toque nos seios, por cima da blusa, como se fosse um descuido. Margarida fingiu que não percebeu. Ela sabia que beijos melhores ainda viriam, mas aquele havia virado uma tatuagem. Nessa noite não dormiu. Passou a madrugada inteira alisando Pablo, o gato de pelos alaranjados, e sussurrando nos ouvidos do bichano “eu beijei eu beijei eu beijei eu beijei”. Escreveu sua primeira poesia, com rimas pobres e nenhuma métrica, mas assim como os beijos melhores que viriam, outras ainda seriam desenhadas.

E os beijos vieram, com o mesmo colega que sorria ao ouvir poesia e que também a levava ao cinema, brincava com cachorros e gatos, passeava com ela de mãos dadas, pagava as contas nas lanchonetes e a pediu em casamento. Margarida passara tanto tempo pensando na sua feiura que nunca se imaginara vestida de noiva. Escolheu um modelo rendado quase infantil e cedeu à vontade da mãe, adornando os cabelos soltos e escovados com uma tiara de margaridas naturais. Nos pés, uma sapatilha branca que lembrava a das bailarinas que ela admirava e nunca conseguira imitar. Quando chegou ao altar, com as mãos geladas agarradas às do pai, o marido, com os olhos marejados, sussurrou ao seu ouvido um “você está linda” e Margarida sorriu, acreditando. Se ela estivesse na frente de um espelho, veria seus olhos brilharem.

Margarida não sabia como ser uma esposa. Continuou no seu trabalho de secretária durante o dia e quando chegava em casa à noite, depois de um metrô e um ônibus, preparava o jantar que eles comeriam juntos, lavava e passava as roupas enquanto via a novela e estava sempre disposta quando ele a procurava. Ela gostava. Antes de dormir, pingava atrás das orelhas duas gotinhas de um perfume delicado extraído de flores naturais. O marido a chamava de “minha Margarida” e ela não sabia, mas era feliz nesse jardim.

Nos finais de semana eles se dividiam na faxina, visitavam os familiares, caminhavam no parque, iam ao cinema e liam poesias juntos. Ela aprendeu a beber um pouco de vinho, uma taça quando os amigos do marido iam a sua casa comer uma pizza. Margarida ria com eles e até passou a trocar confidências com as esposas. Quando elas reclamavam das dificuldades do casamento, Margarida sorria e olhava para o marido no outro lado da sala, com vontade de abraçá-lo. Talvez ela ainda não tivesse aprendido a ser uma esposa verdadeira.

Numa noite em que se preparavam para dormir, ela afofando os travesseiros e esticando o lençol com as mãos, ele disse que queria um filho. Margarida correu para o banheiro segurar o choro. Não se sentia preparada para ser mãe nem para contar a ele. Quando confirmou que estava grávida, um mês depois, engoliu as lágrimas amedrontadas para não estragar a alegria do marido. Ela teria nove meses para se acostumar com a ideia de um bebê crescendo dentro dela e isso aconteceu logo que ela ganhou da sogra os primeiros sapatinhos. Margarida passou dias com eles na bolsa e sempre que se via sozinha, no escritório, no refeitório, no ônibus ou em casa, ela vestia aqueles sapatinhos nos dedos indicador e médio e os balançava. Margarida perdeu a vergonha de cantar, comprou livros de histórias infantis e pediu para a mãe lhe ensinar tricô. Juntas fizeram mantas, casaquinhos, meias e mais sapatos. O chefe deu o berço que ela queria, todo branco, e as colegas do escritório deram mamadeiras, chupetas e muitos pacotes de fralda. Foi Magda, a outra secretária e mãe de duas crianças, quem disse que ela precisaria de muitas. Margarida achou um exagero, mas opiniões como essa ficavam guardadas na sua cabeça. Em retribuição, Margarida sorria e levava um bolo de cenoura com cobertura de chocolate feito por ela para o café da tarde. O chefe era quem mais comia.

Margarida acompanhou o crescimento da barriga todos os dias, de manhã e à noite. Pensava nas fases da lua e achava seu ventre ainda mais bonito. Passou a rir quando deixou de enxergar seus pés. Achou estranho quando sentiu o bebê se mexer pela primeira vez, lembrou de um filme com uma mulher grávida de um alienígena, mas esse foi outro pensamento que ficou guardado na sua cabeça. Depois acostumou.

Antes de dormir, Margarida e o marido acariciavam a barriga de lua e imaginavam como seria o bebê. O maior medo de Margarida era que ele tivesse seus olhos. O marido a beijava e a chamava de boba. Haviam decidido juntos não saber o sexo da criança com antecedência. “Pra quê?”, era o que Margarida respondia diante da ansiedade dos parentes e amigos. Ela passou a entender porquê as gestantes dizem que o importante é que a criança nasça com saúde. Queria seu bebê respirando e depois sorrindo. Os detalhes, ah, esses viriam com o tempo e o maior desejo de Margarida era poder observar essas descobertas.

Os dois montaram o berço e a cômoda. Margarida costurou a cortina e o marido deixou a parede amarela, tão clarinha quanto um raio de sol no inverno. Depois do jantar, os dois passavam uns tantos minutos olhando para as paredes e para o berço, cada um guardando seus próprios segredos.

Com quarenta semanas de gestação, o médico sugeriu uma cesárea. Margarida não entendia essa interferência. “Vai sair, ele vai sair”. Foi depois de um almoço na casa da mãe que Margarida sentiu uma cólica forte. Que aumentou. E aumentou mais. Uma dor assim, só podia ser a vida querendo romper. O marido não conseguia colocar a chave no contato, foi o pai quem a levou para a maternidade, o marido segurando sua mão. Margarida respirava.

Um grito saído de um fundo que Margarida não sabia existir e a vida rebentou, pequena e luminosa, forte e decidida. Um clarão, um estrondo. Deus. Então era isso. É para isso que vivemos? É esse o grande mistério da vida? Deus falava com ela por meio do choro de uma criança. A vida fazia sentido. “É uma menina”. Onde estavam os olhos de catarata?

Nos seus braços, Margarida encontrou o que nem sabia que procurava. Deus pode ter nos inventado, mas não viu nenhuma pessoinha sair de suas entranhas. O mundo ficou pequeno. Aquele momento era o epítome da vida humana.

A menina mantinha os olhinhos fechados e não chorava. Era a mais bela criatura que Margarida já havia visto em toda a natureza, mais bonita até do que os olhos das onças que admirava desde criança. Mais arrebatadora do que qualquer poesia já escrita. Mais nobre do que a arte. Mais encantadora do que as manhãs de outono no parque. Mais entorpecente do que uma taça de vinho. Mais cheirosa do que perfumes florais. Mais brilhante do que uma estrela que apelidou de “minha”. Nomeou-a Jasmim. Uma beleza assim só pode receber um nome de flor.

terça-feira, 22 de novembro de 2011

22 de Novembro de 2011.

Na feira livre da praça hoje cedo:
- Olha lá, minha senhora! Comprando nessa barraca você ajuda as Casas André Luiz. Eu sou o André, ele é o Luiz.

Notas no fim de um dia

O café ao lado do meu escritório é o máximo. O café em si é ótimo e quando eu peço um carioca eles me dão um expresso com uma chaleirinha com água quente que é um charme. O pão de queijo, os lanches e os bolos são uma delícia. E o melhor desse café: os funcionários. São descontraídos e educados. Quando eu peço café para viagem eles preparam no maior capricho. E quando a gente dá caixinha, eles gritam em coro: "obrigado". Alegram o meu dia.

Ah, o ascensorista do meu prédio também é muito bacana. Fico feliz quando vejo que é ele quem vai me guiar até o terceiro andar (não, eu desço pela escada).

Da dificuldade de se educar um filho

1. O melhor aluno da escola queria estudar Engenharia na USP e foi, mas demorou mais tempo do que os outros alunos para se formar, pois as drogas e as festas descobertas na faculdade lhe tomaram uns dois anos.
2. A melhor aluna da classe estudou desde criança para ser médica e passou no Vestibular de uma excelente universidade pública, mas morreu no final do quinto ano da faculdade.
3. O maconheiro queria fazer esses cursos de bicho-grilo, claro, e fez. Tornou-se professor do Ensino Médio, depois da própria universidade onde estudou, depois casou e abriu uma empresa de consultoria e hoje está rico e feliz com seu trabalho.
4. A aluna média mas extremamente responsável e preocupada com o que pensam dela começou uma faculdade e largou, terminou duas e pensa em fazer a terceira, mas não sabe bem qual.
5. O garoto que só ia bem nas aulas de Educação Física não virou atleta, mas se apaixonou e foi trabalhar para pedir a namorada em casamento. Hoje sustenta a família com sua pequena empresa.
6. O bagunceiro que foi expulso de duas escolas um dia resolveu estudar para o vestibular de Medicina e fez dois anos de cursinho. A notícia de que havia sido aprovado numa faculdade pública chegou quinze dias depois da sua morte.
7. O menino que queria ser executivo e um dia presidente de uma empresa multinacional fez faculdade de engenharia, especialização em administração e MBA e hoje, tão novinho, já é diretor da multinacional em que escolheu trabalhar.

sábado, 19 de novembro de 2011

19 de Novembro de 2011

- Eu quero cancelar o serviço.
- Qual seria o motivo?
- Bom... eu estou sem sinal há mais de uma semana. Entrei em contato com você, que até foram muito gentis em um primeiro momento. Agendaram para a assistência técnica vir resolver o problema. Eu acordei cedo, deixei de ficar com a minha mãe no hospital, fiquei plantada como uma palhaça o dia todo, e o técnico não apareceu. Quando entrei em contato com vocês me informaram que o técnico havia resolvido mudar o dia da visita. Sem me avisar! Para um dia que não seria permitido entrar no meu condomínio. Depois de inúmeras solicitações e ligações um atendente disse que resolveria a situação e ficou de me ligar em 10 minutos. Eu estou até agora esperando, então resolvi mudar para o concorrente. Por isso.
- (levantando a voz e transparecendo bastante impaciência) A Senhora veja bem, a assistência técnica é terceirizada e a gente não tem nada a ver com alteração da visita...
- Sinceramente, não me interessa a logistica interna de vocês. Eu quero cancelar o serviço.
- (mais exaltado) Ah! Então só a senhora fala, e eu não posso falar?
- Eu não estou pedindo explicações. Eu quero apenas cancelar o serviço.
- (tom sarcástico) Você é quem sabe... Qual endereço devo mandar o boleto de multa?
- Multa? Como assim multa?
- (rindo) Ah! Agora a senhora quer conversar! Antes não queria, agora eu tenho de explicar?
- Tem sim senhor! Eu não quero que o senhor me convença a não cancelar o serviço, mas o senhor tem de me explicar porque e o que está me cobrando para cancelar.
- (sarcástico) Será cobrada uma multa de fidelidade proporcional no valor de R$300.
- (indignada) Eu não vou pagar isso! Fidelidade de quê? De TV à cabo?
- (gritando) Olha, minha senhora! Eu vou mandar o boleto, se a senhora vai pagar ou não é problema seu. Eu não vou deixar de te cobrar a multa porque você está me ameaçando.
- Eu não estou ameaçando nada. Só acho que não tem propósito nenhum cobrar essa multa. Vocês não me ofereceram nenhuma exclusividade por ela.
- (gritando ainda mais) Está ameaçando! Está ameaçando sim!
- Você jura para mim que esse é o seu protocolo de atendimento? Que bater boca com o cliente que quer cancelar a conta faz parte do protocolo de atendimento? Jura mesmo que vai ficar batendo boca comigo?
- (cínico) Alô... Alô... Não estou ouvindo a senhora....
- Ok, faz o seguinte. Manda o boleto, mando o que for. Só quero me ver livre da SKY o mais rápido possível!

sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Encontros

Chile, Argentina, Venezuela e Brasil encontraram-se para comer camarão na moranga - oferecido e feito pela Venezuela para fazer uma festa de despedida para Argentina, que está de mudança para o futuro reino de Kate e William.
Na verdade, somente tres puderam degustar a iguaria, pois Chile marcava sua presença de maneira virtual, via Skype, pois já retornou para a terra natal de seu marido Suiça, levando, obviamente, seus filhos Suiça Jr e Brasilzinho.
Este encontro, não era o primeiro e muito provavelmente não será o último deles. Mas foi único.
Depois de quatro anos de convivencia intensa, cada um dos presentes estava começando a trilhar um caminho diverso daquele que, como já dito, compartilharam nos últimos quatro anos.
Chile foi falar francês...
Argentina vai aprimorar seu inglês...
Venezuela busca carteira assinada...
Brasil virou avó e vai escrever...
E a saudade vai apertar. Ô se vai...

Não atirem no humorista. FolhaSP 18/11/2011.

TENDÊNCIAS/DEBATES

Não atirem no humorista

EDUARDO MUYLAERT



O humor é livre no Brasil. Sua dignidade constitucional foi reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal como parte da liberdade de expressão e de criação artística.
O direito ao sarcasmo foi garantido na chamada "Adin do Humor", relatada pelo ministro Ayres Britto. A superada Lei de Imprensa já não tinha mais eficácia. A liminar de 2010 veio suspender regra da lei eleitoral que cerceava pilhérias envolvendo candidatos.
"Nós vamos liberar o humor", diz o ministro Ricardo Lewandowski. "Mas vedar o humor? Isso é uma piada", lança o ministro Peluso.
O presidente do STF já julgara, no Tribunal de Justiça paulista, que não se pode reprimir aos humoristas profissionais e à imprensa, ainda quando demasiadas na forma e cáusticas no conteúdo, as expressões artísticas sob as quais exercitam o direito da crítica.
Decorre da liberdade constitucional do humor que eventual excesso é preferível a qualquer censura ou repressão, pois é próprio do humor o exagero, a hipérbole. E o simples fato de alguém eventualmente se sentir ferido não pode restringir a atividade, dada a índole subjetiva das reações individuais.
Muitos objetam com os possíveis excessos, mas a jurisprudência se inclina claramente pela liberdade. Para o STJ, não cabe aos tribunais dizer se o humor praticado é popular ou inteligente, de bom ou de mau gosto, classificação considerada discriminatória e odiosa no voto da ministra Nancy Andrighi. Só a crítica pode avaliar o humor, reconhecido como atividade artística.
As pilhérias envolvendo políticos, policiais, jogadores de futebol, atrizes, entre outros tantos, revelam que o tempo da censura está ultrapassado. Até mesmo a figura do presidente da República tem sido objeto de humor.
A liberdade de expressão incomoda, e sempre houve tentativas de cercear sua atividade.
Quem não se lembra da perseguição aos que ironizavam a ditadura? E das ameaças aos que brincaram com o profeta ou com a religião?
Todas as vezes em que a sociedade optou pela repressão, escreveu páginas trágicas. Nova York pediu tardiamente desculpas pela prisão de Lenny Bruce, comediante cujo humor não tinha sequer a ousadia da comédia das noites de sábado.
A liberdade é essencial ao humor. É próprio do humor o contrassenso, o absurdo, o contrário de tudo que é tido como normal. Parte da graça de um comediante, ensina um manual, é que pode dizer coisas que uma pessoa normal não pode ou não quer dizer.
A crítica, a discussão na imprensa e a opinião pública é que poderão servir de parâmetro para essa nova geração de humoristas, que, às vezes, exageram ao brincar com fatos históricos ou valores sobre os quais não pararam para refletir.
A questão da liberdade do humor é séria. Não se pode levar a sério o que é mero humor, produzido num contexto de humor, com a intenção apenas de fazer rir. Essa liberdade a Constituição assegura e nossos tribunais garantem.

17 de Novembro de 2011. (Ontem)

Na estação de Pirituba fizeram uma pintura de Michael Jackson menino. Duas jovens negras, muito bonitas e produzidas, estão vestidas para um inverno polar. Um ambulante passa vendendo chocolate. Sulflair à R$2. Um homem de meia idade está com uma sacola preta cheia de mercadorias chinesas para vender. Ele checa uma por uma, e abre as embalagens experimentando os produtos. Palhetas para limpador de parabrisas. Chaveiros de esqueletos fluorescentes nas cores laranja, amarelo e verde-limão. Dois ambulantes passam vendendo amendoins e chicletes. R$1. Eles se vão. Todos no vagão mastigam. O homem de meia idade mostra para um senhor careca de orelhas grandes os produtos. O senhor parece o Mr. Magoo. O homem de meia idade puxa uma cordinha de um chaveiro de caveira amarelo. A caveira bate o maxilar frenéticamente. O adolescente gordinho que está em pé na porta do trem se vira interessado no barulho. Uma mulher vestida com roupas esportivas de marca dos pés à cabeça insiste em ficar de pé no meio do vagão, embora haja assentos vagos. O homem de meia idade se levanta e se despede do senhor orelhudo. O senhor orelhudo possui uma aparência bastante digna. O homem de meia idade desembarca na estação Vila Clarice. A mulher de roupas esportivas também.  O senhor orelhudo de aparência digna se ajeita no assento, ocupando dois lugares. Ele aperta uma narina com um dedo e assoa o nariz no ar. Toda sua dignidade se vai no assoalho do trem. A jovem com medo do frio polar chora.

Frases bem ditas

"Eu te amo", sempre. Se você diz "eu te amo" é porque existe alguém que te conquistou e que torna o mundo melhor para você.

"Estou com saudades" significa que você guarda pessoas, coisas, momentos, sensações e lugares no coração.

"Obrigado". Alguém fez alguma coisa por você, pequena, grande ou enorme, mas algo foi feito para você.

E a que eu mais gosto: "amigo de infância". Ter um amigo desde a infância é ter encontrado uma parte de você que não tem seu sangue, mas tem parte da sua alma.

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Morte minguante

Se eu morrer agora...

Nada indica que eu vá morrer agora. Estou na sala de uma casa rodeada de pastos por onde circulam também cachorros e pássaros, numa região em tempos de paz, longe da estrada e da rota dos aviões. Só umas mariposas à procura da luz que me serve passam por cima da minha cabeça silenciosa.

Choveu o dia todo. Duvido que alguma palha fugida de um cigarro aceso possa colocar no mato um fogo capaz de me encontrar aqui parada. Não ouço mais trovões e ao redor dessa casinha a árvore mais alta é uma roseira.

Sinto meus órgãos e células em bom funcionamento. Nenhum câncer sorrateiro me corrói, o colesterol está como deveria estar e a pressão...não há nenhuma pressão por aqui. Pareço uma menina, foi o médico quem disse.

Então é quase impossível que eu enfarte agora, sentada à mesa de jantar em frente a um bloco de papel e uma caneta. Com exceção de um tio que sofreu um derrame no meio da noite, todos aqueles que carregaram o meu sangue antes de mim morreram porque chegaram ao fim. Portanto é pouco provável que o fim chegue até mim e chegue agora.

Mas, como não duvido da criatividade da vida e das razões da natureza, se eu morrer agora, vou tomada por essa alegria que nos pega distraídos no dobrar de uma esquina como uma lufada, mas com a delicadeza de um assopro. Essa alegria que entra pelos dedos dos pés e das mãos e caminha como se andasse sobre pétalas de rosas até o útero, centro da existência. Essa alegria tão quentinha quanto uma família reunida debaixo de uma lâmpada para dividir o pão fresco no fim de uma tarde fria e chuvosa.

É difícil que eu vá, mas se eu morrer agora, levo grudada na retina essa lua minguante que do lado de lá da janela me seduz e me reduz.

Quando eu era criança, gostava de ouvir minha avó dizer tão molemente a palavra “minguante”. Eu ficava ali agarrada à sua saia, olhando para cima na esperança ainda vã de que um pedacinho quente e dourado da lua escorresse até as minhas mãos.

Essa mesma lua minguante que hoje aponta para o nascer de um sol que, eu sei, me esquentará amanhã, mas se eu morrer agora...

Luciana Gerbovic
Outubro/2011

Constatação

Acho que estou na contramão.

Pensamento do dia

É difícil manter o peso, dificílimo perder.
É difícil ganhar dinheiro. Pra mim, então, muito difícil.
É difícil manter o casamento. Muito muito difícil.
É difícil criar filhos. A missão mais difícil de todas.
É difícil manter a casa limpa e arrumada. Quase impossível arranjar alguém para trabalhar nela enquanto eu trabalho fora.
É difícil arranjar tempo para ler, escrever, namorar, passear, sair com os amigos.
É difícil encarar o trânsito de uma cidade super lotada de pessoas e coisas.
É difícil viver com a violência urbana e a falta de ética.

Uma coisinha fácil. Eu queria apenas uma coisinha fácil de se conseguir.

quarta-feira, 16 de novembro de 2011

Boa noite, São Paulo!

Nove da manhã, entrando no carro em frente a uma escola infantil: um homem passa correndo e gritando "pega ladrão pega ladrão pega ladrão". Corre tropeçando nas próprias pernas e no desespero, mas sua moto foi embora com quem não trabalha para possui-la.

Alagados, Trenchtown, Favela da Maré, a esperança não vem do mar, nem das antenas de TV, a arte de viver da fé, só não se sabe fé em quê

Meio dia, dirigindo um carro a vinte por hora, velocidade média possível na Alameda Santos: dois policiais numa moto fazem sinal para eu parar e vão ao encontro de um carro de bombeiros para socorrer uma mulher grávida caída na rua com as pernas ensanguentadas.

Pois paz sem voz, paz sem voz, não é paz, é medo

Oito na noite, dentro do carro esperando o semáforo liberar o caminho: uma mulher bate na janela do meu carro gritando peloamordedeus para eu deixá-la passar assim que o semáforo abrir pois ela tem um acidentado dentro do carro dela, logo atrás de mim. Eu entendi e fiz o que pude, os outros não. Ela não tinha como avisar todos os motoristas.

And so Sally can wait, she knows it´s too late, as we´re walking on by

Oito e meia da noite, chego em casa: não, aqui na cidade que me pariu, minha cidademãe, isso não é sinônimo de segurança. Talvez de um pouco de descanso, um pouco apenas.

segunda-feira, 14 de novembro de 2011

14 de Novembro de 2011.

Uma semana. Faz uma semana que meus canais favoritos da Sky estão digitalizados e impossíveis de serem assistidos. Uma semana. Só meus canais favoritos. Nada de "House", de "The Good Wife". Nada de ver o Agente Stabler em "Law and Order - SVU". Nada de assistir reprise de "Friends" ou meu sagrado noticiário matutino na Globo News. Nada de nada. Foram várias ligações até agendarem uma visita técnica para hoje, às 8h. Ou a partir das 8h. Meio de feriado, meio chato. Acordei, me troquei. Fiquei apresentável para a visita do doutor. Resumo da ópera: ele nunca veio. Então foram mais tantas ligações de protesto, muitos nervos exaltados e mãos perdidas com atendentes de robotizadas. Deus! Quem inventa esses protocolos de atendimento? Ninguém sabe ser flexível? Reclamei no Facebook. Reclamei no Twitter. Reclamei no "Reclame aqui" (afinal o nome pedia que eu reclamasse). Mais um tanto de ligações e eu perdi uma série de tijolinhos no céu por descarregar propositalmente minha raiva em pessoas que eu sabia "estavam fazendo apenas seu trabalho". Enfim, vou para retaliação final. Cancelo meu plano de serviços. Contrato a concorrente. E quando tudo parecia tão vingado, ligo a TV pela primeira vez no dia e... Todos os canais funcionando. Brilhando e sorrindo para mim.

domingo, 13 de novembro de 2011

13 de Novembro de 2011

Passei o dia limpando a casa. Faxina de verdade nessa minha nova fase "européia" de ser. Tirei pó, aspirei, passei pano no chão. Afofei as almofadas e lavei roupas. No final do dia estava tudo tão impecável que brilhava. Então recebo amigos em casa, o Dri veio com a Paçoca. Paçoca foi resgata me uma noite de terror, no escuro do centro, quando todos voltavam do Bar B para casa. Virou cã de estimação. E sem protesto algum, permiti que Paçoca comesse pipocas em cima do sofá. Como agradecimento, lambeu os dedos do meu pé sem parar. Estamos fazendo progressos no ramo das neuroses pessoais.

sábado, 12 de novembro de 2011

Day after

Se ontem anunciavam o mais cabalísticos dos dias para a Humanidade desta era, esqueceram de informar que, da mesma forma que depois da tempestade, vem a bonança - para um dia cabalístico também existe um "day after".
E esse, que até tinha pinta de bacanudo, ferrou tudo.

sexta-feira, 11 de novembro de 2011

11.11.11

Talvez eu fosse mais feliz se acreditasse mais. Mais em mais coisas como, por exemplo, um acontecimento capaz de mudar o mundo ou a humanidade só porque hoje é dia 11.11.11. Quer dizer, hoje é 11.11.2011, deve ter sido mais assustador ou encantador mesmo em 11.11.1111. Escrita, a data perde a graça: 11 de novembro de 2011. E piora: onze de novembro de dois mil e onze.

Não sei se tudo isso é apenas uma brincadeira. Para alguns acho que não. Para mim é apenas uma data bonita. Se eu estivesse grávida já aos nove meses, pensaria numa cesárea. Não estou, portanto só penso na beleza dos números combinando. Gosto de números que combinam. Por exemplo, alguém que nasceu em 07.07.70. Ou que casou em 02.03.04. Mas prefiro os pares. Acho número ímpar extremamente antipático e egoísta: na divisão por dois sempre sobra um. Gosto do 8, essa volta infinita. Nasci no dia 28, que bom. A médica da mamãe quem escolheu, não por causa do 8 ou do 2 ou dos dois juntos. Era o melhor dia para ela arrancar a menina que não queria sair do útero.

Mas, voltando, se eu acreditasse que o mundo dá a mínima para esse calendário inventado por nós, talvez eu fosse mais feliz. Mas o mundo, o planeta Terra, o universo em que ele flutua, nada disso está se importando com a gente e com as nossas invenções, desde o calendário até a bomba atômica. Se um dia acabar por culpa nossa ou não, a coisa começa de novo em algum canto por aí. Melancholia está aí, nem um pouco preocupada com a gente, pessoinhas que não enxergam um palmo a frente do umbigo, muito menos se hoje é dia 11.11.11 ou 25.07.69 ou 08.05.12.

Até o fim do mundo, resta-nos viver com a dor de se saber sozinho no universo.

quinta-feira, 10 de novembro de 2011

10 de Novembro de 2011

Mami ressona na cama do hospital. Procedimento bobo de última hora, mas que deu internação, muita espera, horas de pé e a mudança do meu escritório de trabalho para um sofá no Hospital São Luiz. Para comer só quiche ressecada de estufa do café ou um desses lugares de firma em volta do hospital. Muito sono e uma conta salgada de estacionamento. Ela está se divertindo. Achando ótima toda atenção recebida, e aproveitando a oportunidade de dormir o dia todo e refeições na cama como se fosse um SPA 5 estrelas. Termino o dia pensando como eu não gostaria de uma internação de 3 dias. Precisava tanto de uma desculpa para sumir e desligar.

quarta-feira, 9 de novembro de 2011

09 de Novembro de 2011

Fiz duas aulas seguidas de ballet. Fazia tempo que nada me dava tanta vontade de treinar, de aprender, de me superar. Ando longe, bem longe de posar de candidata ao Bolshoi. Mas eu gosto da meia ponta. Gosto da meia-calça. Dos exercícios de barra, do porte de princesa. De brincar de bailarina. Mesmo fazendo as sequências básicas, acho lindo. Gosto de quem sou de coque e sapatilha.

terça-feira, 8 de novembro de 2011

À espera do amor na Paulista

Eu não sei a que horas ela chega nem a que horas vai embora, se é que vai. Mas ela está no canteiro central da Paulista, na altura do MASP, em todas as horas do dia em que passo por lá: cabelos encaracolados grisalhos presos num rabo de cavalo bem trabalhado, meia soquete branca dentro de um sapatinho de salto preto, saia rodada na altura dos joelhos que mostram suas pernas finas, blusa abotoada até o pescoço por baixo de um blazer marrom, com as duas mãos apoiadas numa sombrinha fechada que toca sua ponta no chão. Ao seu lado, duas malinhas.

Na primeira vez que a vi, ela conversava com um motorista. Por causa das malas achei que ela pedia dinheiro para ir a algum lugar. Mas tantos dias depois, será que ela já não teria juntado dinheiro para ir sei lá pra onde quer ir?

Hoje ela estava lá de novo e eu descobri que ela não vai. Ela espera. Espera um amor que se perdeu apenas fora dela. Um amor desses tão grande que não precisa ser vivido. Um amor que ela espera passar dentro de um carro, de um ônibus ou a pé. Tanta gente passa pela Paulista, por que não o seu amor? Um amor que ela carrega há tantos anos dentro de si (quantos mesmo?) e que bastaria ser apenas sentido; mas, ah, agora, já com tantas rugas no corpo e obrigações cumpridas, por que não tentar vivê-lo?

Talvez ele passe até de bicicleta.

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

10 motivos para uma segunda-feira feliz

1. Chai para viagem no café ao lado do escritório
2. Uma semana pela frente com a possibilidade de novos negócios
3. Todas as pessoas que eu amo estão com saúde (só isso já bastaria, mas vou procurar os outros nove)
4. Saiu a tradução direta do russo de Guerra e Paz, pela qual eu tanto esperava
5. Semana com encontro sobre Ulisses
6. Meu filho completará o primeiro ano de vida no fim da semana
7. Acordei sem a febre com a qual fui dormir ontem
8. Um dia com sol é sempre mais alegre, por mais que eu goste de um dia cinza para trabalhar
9. Almoço no Paribar, meu pedaço de Paris em São Paulo
10. E para quem gosta, Zezé e Luciano não se separaram!

domingo, 6 de novembro de 2011

Cadê o texto que estava aqui?

A pessoa acorda num domingo ensolarado depois de nove horas seguidas de sono, o que, para essa pessoa, atualmente, é o maior presente que ela poderia ganhar. Nem a lembrança de sonho conturbado, que a fez acordar com a música Cuitelinho na cabeça, bem naquele trecho "a tua saudade corta como um aço de naváia", sabe?, conseguiu esfumaçar a aura de um domingo ensolarado após nove horas de sono.

Um texto italiano para estudar, um filho para brincar, um filho para buscar, um café da manhã para tomar e a pessoa sente vontade de escrever um texto alegre, leve e acolhedor. Um texto que combine com uma manhã ensolarada de domingo. Um texto que nos abrace, sabe?

Então é esse texto que a pessoa fica procurando no coração, depois na mente e por fim nos arquivos. Mas esse texto, não aparece.

sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Presente de Grego

Europa: escândalo político, caos bárbaro, anarquia catastrófica, tragédia apocalíptica, hipocrisia histérica. Obrigado, caros gregos, diz também a etimologia.

Europe : le scandale politique, le chaos barbare, l'anarchie catastrophique, la tragédie aopcalyptique, l'hypocrisie hystérique. Merci, chers Grecs, dit aussi l'étymologie

Hervé Le Thelier, no Check-list do Le Monde.

04 de Novembro de 2011.

5 Barras de chocolate
1 Pote de Nutella
3 Miojos sabor Legumes
1 Pacote de pão de queijo congelado
1 Pacote de salgadinho de arroz japonês apimentado
3 Caixas de chá (sabores diversos)
1 Ramalhete de Gérberas

Eu nunca sei diferenciar quando estou triste ou quando estou deprimida. Como não tenho nenhum motivo para estar triste, imagino que esteja deprimida. O que acontece quando isso acontece é que eu fecho a ostrinha, desligo o celular. Como porcaria e durmo por dias. Bom, eu não tenho mais "dias" para dormir. Mas vou dormir o final de semana inteiro. E me entupir de gordura trans.

Contradição

Lóg. Princípio lógico de que uma coisa não pode ao mesmo tempo ser e não ser, o que implica o caráter verdadeiro da exclusão do contrário (Aulete)

Todos sabemos o que é contradição, mas só as mães SENTEM a contradição.

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

03 de Outubro de 2011

Fiquei cética. Não acredito mais no amor.

Shoes are a girl´s best friend?

Então no sonho dessa noite eu fui chamada para ajudar uma indiana (que pela fisionomia era chinesa) que tinha tentado se matar. Cheguei à noite num hotel de construção típica chinesa, com aqueles telhados pontudinhos e lindos jardins espalhados pelo local, e a indiana que na verdade era chinesa me esperava com um belíssimo robe de seda vermelho. Ela tinha aquela pele branca de porcelana chinesa mesmo, os cabelos negros compridos e lisos estavam soltos e as mãos delicadas tremiam ao me mostrar a carta que ela havia escrito antes da tentativa de suicídio que não deu certo. Quis se matar por causa da traição do marido. Eu não falei nada e ela foi dormir mais tranquila, foi o que ela me disse.

Enquanto ela dormia eu rodei pelo quarto do hotel, que era enorme, quase a totalidade da hospedaria, e descobri no armário lindos pares de sapatos vermelhos, pretos, azuis, verdes, beges. Prada, Louboutin, Channel, D&G, Dior. Roubei quase todos e larguei a indiana-chinesa-deprimida dormindo.

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Morte

Ao redor dos dez anos, quando faleceu Humberto Sarcinella, meu avô paterno, lembro direitinho da seguinte cena.
Horário do intervalo no Externato Vieira de Moraes, no bairro de Campo Belo. Minhas amigas - hoje seriam chamadas de BFFs (ainda prefiro "amigas"), Mônica (morena e carioca) e Marta (loira escuro e paulistana) se aproximaram para ouvir meu segredo.
Em um círculo, pequeno e apertado, olhando para os lados - garantindo que ninguém estranho estaria próximo para nos ouvir - revelei o que se passava em minha casa.
- Meu avô morreu.
Silêncio e uma certa apreensão. Pausa dramática, olhar para os lados, continuei:
- Mas não contem prá  ninguém... NINGUEM, ouviram? Pois é segredo. Minha família tá mentindo... estão fazendo um inventário...

E nesse dia de finados...

A foice da morte já me arranhou de várias formas. Na primeira foi de leve, bem de leve, só para mostrar que ela existia. Aos 9 anos perdi meu cachorrinho querido. Acho que é a melhor forma de uma criança aprender a lidar com essa que nos espreita desde o nascimento, fazer o quê...

Depois ela passou a foice pesando um pouco a mão, mas ainda dentro da cartilha. Levou meu avô tão amado. Desde que eu aprendi o que era a morte, eu imaginava, ainda criança, meu avô morto e planejava me esconder dentro do caixão com ele, de uma forma que ninguém me visse, para que eu pudesse ficar com ele para sempre. Hoje me pergunto se esse tipo de pensamento é normal para uma criança, mas essa é uma outra história. Eu não fui nem no velório nem no enterro e só chorei sua morte uns dois anos depois. Sinto tantas saudades dele.

Aí um dia a morte veio sem dó e fincou a foice no meu coração e desceu rasgando o que tivesse pela frente até os dedos dos pés. Se tivesse mais espaço, ela continuaria. Fora da cartilha, de surpresa, para mostrar sua força, para mostrar que contra ela ninguém pode nada. Enterrei um namorado que tinha acabado de completar vinte anos, acho que a pessoa mais risonha que conheci até hoje. Uma delícia!

Mas para essa grande dama poderosa não há obstáculos e lá vem ela dilacerando o que sobrou ao levar minha grande, querida, amada, melhor amiga. Coitada, até hoje ela escuta meus lamentos! E participa das minhas alegrias.

Depois meus avós e outras pessoas queridas.

Não tem como não lembrar deles nesse dia de finados, não tem como não lembrar dessas pessoas todos os dias, algumas delas todos os dias mesmo. São pessoas tão presentes na minha vida quanto minha mãe que está aqui agora ao meu lado, brincando com meu filho.

...eu penso como viver é lindo.

02 de Novembro de 2011

Das coisas que eu mais gosto na vida: Ficar na cama de manhãzinha acordada.
Nada dessa coisa de acordar e levantar, trocar de roupa, começar a vida. Bom mesmo é acordar, espreguiçar, espreitar as horas no despertador da cabeceira de cantinho de olho, com a cara ainda enfiada no travesseiro, sentindo o aroma do amaciante de roupas no lençol da cama. Rolar para o outro lado e sentir o lençol mais gelado. A cama é queen, mas vazia. A Rainha é virgem e dorme sozinha. Gosto de tentar adivinhar como está o clima lá fora, pela fresta da cortina na janela. Planejar o café da manhã. Pensar em coisas legais para fazer no dia.

Das coisas que eu mais gosto na vida: só são possíveis de forma esporádica. Em feriados, casamentos, funerais e batizados. Senão perderia a graça.

terça-feira, 1 de novembro de 2011

Ele se foi

Outubro agora só em 2012 (se o mundo acabar em 2012 mesmo já se sabe em que mês será?). Novembro chega com promessa de festas, comemorações com pessoas queridas, projetos literários, artigos jurídicos, provas, trabalho, dias na praia e esperança de que tudo isso se realize sim. Estou cansada como nunca imaginei que uma pessoa pudesse ficar, mas quero tudo isso e muito mais porque eu gosto disso aqui. Será uma pena se acabar em 2012.

E já nesse primeiro dia de novembro (be welcome, babe), lembranças da minha avó Miroslava Dragojevic Bosko Gerbovic (quando eu era criança minhas amigas competiam para ver quem decorava o nome dela primeiro), que hoje faria 93 anos. Curta aí, vó Slava, com muita música e dança e palhaçada, do jeito que a senhora gostava!