sábado, 31 de dezembro de 2011

Feliz VOCÊ, seja lá qual for o ano

Nasci em sessenta e três.
Quarenta e oito anos se passaram desde então e algumas coisas aconteceram. Já tenho algumas histórias para contar.
Enterrei pessoas queridas e amadas e fui a pessoa que discursou nestes funerais. Homenagear aqueles que amamos com a voz embargada é tarefa das que menos gosto. Aprendi que é melhor fazer isso aos poucos, mas todos os dias. Nem sempre consigo praticar...
Vi nascerem crianças amadas e contribuí com a vinda de duas delas. Ganhei outras duas de presente e por escolha, trabalho/aprendo com outras tantas que foram rejeitadas.
Fui sequestrada duas vezes, uma delas com minha filha no carro e com uma arma apontada para sua cabeça de apenas cinco anos. Esta mesma filha, por descuido do pediatra, caiu da mesa de exames e entrou em choque. A culpa ficou comigo.
Entrei em depressão, fui parar no hospital e a única coisa que tiveram certeza é que não sabiam o que eu tinha. Cogitaram tentativa de suicídio. Eu? Me poupe... Sou covarde demais para isso.
Ao nascer o primeiro grande amor incondicional da minha vida, Lucas, quase morri com a quase morte dele.
Emagreci, engordei e tornei a emagrecer. Engordei de novo. Crescer, só um metro e cinquenta e seis centímetros.
Namorei, transei com amor e sem, beijei, abracei, casei, descasei e casei de novo. Fui feliz e triste. Chorei e gargalhei. Fiquei impassível também. Desejei muita gente que nem me olhava. Fui incapaz de perceber os que me queriam.
Rejeitei muita gente que depois aprendi a respeitar. Meu padrasto é um exemplo vivo disto. Bem paciente ele...
Já ganhei muito dinheiro e gastei tudo. Fiz faculdade, curso de tarô, de escrita criativa, eneagrama, programação neurolinguistica, coaching, desenho, pintura em cerâmica e também fiz nada muitas vezes e por muito tempo.
Privilégio de poucos, eu sei, pisei em todos os continentes deste mundo, morei na Alemanha e voltei para São Paulo. Viajei só e não gostei e também já viajei acompanhada e não gostei. Amores foram desfeitos neste trajeto e algumas amizades também.
Falei muito palavrão, xinguei no transito, sofri acidentes.
Passei por revista em cadeia para visitar alguém que eu muito amava, descrente que estivesse envolvido em assassinato. Estava envolvido, foi preso, julgado e condenado. Chorei.
Tive compaixão por assassina de Yorkshire e ódio mortal de motoqueiros que levaram meu espelho lateral. Fui incoerente, confusa e me senti pequena.
Disse coisas que magoaram alguma pessoas. Todas muito generosas, me perdoaram. Eu também perdoei.
Fui à igreja, mesquita, sinagoga, centro de umbanda, candomblé e espírita. Pedi, desavergonhadamente, para qualquer santo, orixá ou rabino que concretizasse os meus desejos. Arregacei as mangas também.
Tenho medo.
Assim como o sol nestes quarenta e oito anos, o medo é presença constante. Amigos íntimos. Crescemos juntos e eu aprendo muito com ele.

Estou esquecendo de muitas coisas e outras estou omitindo mesmo.
Vou passar a meia noite deste trinta e um de dezembro de dois mil e onze numa super festa e minha mãe passará no hospital se recuperando de uma cirurgia cardíaca. A vida é assim mesmo, extremos inclusive na virada do ano.

Tem fatos que eu gostaria que tivessem sido diferentes outros que não tivessem existido e de muitos tenho saudades e jamais serão revividos. Apenas lembrados.

Gosto do fato de poder estar celebrando mais uma virada, sem saber o que me aguarda, quem vou conhecer, quais fatos novos exigirão de mim o melhor que tenho para oferecer e diante dos quais irei me acovardar. Sei que estarei aqui para o que der e vier. Assim como você.

Feliz você!

Adeus ano novo

Quando eu era criança, achava que o ano novo e o ano velho se alternavam na chegada às nossas vidas. Um ano a gente deveria cantar "adeus ano velho, feliz ano novo" e no outro "adeus ano novo, feliz ano velho". Até que num ano perdi a contagem e perguntei para a minha mãe quem chegaria: o ano novo ou o ano velho? E ela respondeu que era sempre o novo que chegava, essa alternância não existia. Como eu podia ser tão burra?, pensei. E nunca mais me atrapalhei com a música, era bem mais simples do que eu pensava.

Hoje, tantos anos depois, acordei com saudades daquela menina que de burra não tinha nada. Acordei com saudades da menina que acreditava que o velho pode substituir o novo. Que ela renasça em mim em 2012.

sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

Carta para 2011

Dois mil e onze,

você não me fez mal algum, afinal é apenas uma invenção romana incapaz de cometer qualquer maldade ou bondade contra quem quer que seja, mas, mesmo assim, não consigo começar essa carta com um “querido” antes do seu nome.

Depois de amanhã você será apenas história e para mim não será das mais bonitas. Derramei mais lágrimas durante a sua existência do que em toda a minha. Acordar durante os seus dias foi uma batalha. Diária. Direi “adeus” a você cansada, quase dilacerada, mas ainda não será dessa vez que desistirei. Para sorte de uns e azar de outros, eu tentarei mais uma vez. Talvez duas. E a partir de hoje, de já, e se não der, do já que virá depois e sempre, até a minha existência virar apenas história também. Bonita para alguns e feia para outros.

E chega por ora. Estou sem energia.

As risadas foram ínfimas perto das lágrimas, mas existiram e eu aproveitei cada uma delas. Convivi com pessoas que me mostraram que vale a pena estar aqui. Li textos lindos. Escrevi muito para conviver com a dor e escrever sempre me faz bem. Conheci pessoas merecedoras de coisas boas. Senti saudade, sinal de que tenho belos segredos no meu coração. Fui a lugares que não conhecia. E eu sempre gosto de conhecer, seja um lugar, um sabor, uma pessoa, um sentimento, uma obra de arte, um som. E ouvi a risada dos meus filhos, o som mais bonito desse mundo perdido na Via Láctea.

Espero que 2012 me encontre serena e que ele ouça mais a minha alegria do que você.

Luciana Gerbovic Amiky

quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

E se?

Hoje, só hoje, a gente dançasse e se amasse no meio da sala, como daquela vez sobre as pedras? Eu dançaria descalça. Você foi o único que gostou dos meus pés.

Aqui sentada eu vejo tantas pessoas lá fora. Contei setenta em um minuto. Se eu ficasse aqui um dia inteiro veria cem mil e oitocentas. Num ano trinta e seis milhões setecentas e noventa e duas mil e eu não te vejo desde que nos despedimos numa rodoviária há dez anos. Eu ficando e você indo. Você e a pessoa que eu gostava de ser que só existe em você. Perdi duas vezes. Três. Você também levou o filho que não tivemos. Só me lembro de ficar ali reduzida, vendo você, eu e nosso filho partirem dentro daquele ônibus. Não sei aonde chegaram, nem quando. E se chegaram.

Só você viu em mim a alma e a cor de uma leoa caminhando sob o sol. Só você sentiu medo do meu sofrimento no futuro. Só você me protegeu da chuva debaixo de uma rocha. Só você riu quando eu explodi um pudim no meio da cozinha e caí num choro como se fosse boba. Eu até hoje não sei lidar com desmoronamentos. Fico tentando segurar destroços tão maiores do que minhas mãos. Não consigo viver bem com a hipótese de que muitas histórias não chegam a um fim. Feliz ou triste, elas simplesmente não têm um fim. E é assim e eu preciso aprender a aceitar.

Eu sei que hoje você usa terno. Ao lado de outra. Só ela te vê. Mas só dos meus pés você gostou.

E se hoje você fosse uma das pessoas que passam e ficasse? Só para uma dança no meio da sala ou da rua, você escolhe. Eu dançaria descalça, bêbada de silêncio. No fim da dança você olharia meus pés, sorriria, vestiria seu terno para ela e partiria. Talvez levando apenas você.

segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

Essa é uma obra de ficção etc etc etc

O almoço

Água oxigenada em casa? Não, não tenho. Pode deixar essa mancha de sangue na toalha. São apenas os meus óvulos não fecundados por falta de amor. Ainda insistem nessa cor viva. Eu deveria soltar cinzas pelo meio das pernas. Já viu coerência em pote para vender? Talvez ao lado da água oxigenada? Não? Deixe pra lá, logo chega a hora do almoço e ele ainda dorme. Tenho esses olhos inchados porque sou alérgica a lágrimas. Justo eu que vivo afogada. No banho eu sempre torço para que as gotículas de água quente não se desprendam do alumínio do boxe, mas elas não conseguem se segurar e eu choro ainda mais. Já viu que elas se desfazem e não arrebentam? Se um dia eu pedir socorro no banho, não me obedeça, será um grito saído só da garganta. O que me revela está no meu útero, aonde ninguém chega e de onde ninguém sai. O que temos para o almoço hoje, além do meu suicídio? Não, nada de acompanhamentos. Talvez um café amargo antes e Chopin durante. Gosto tanto de suas músicas, mesmo sem saber nomeá-las. Coloque qualquer uma. Você já aprendeu a mexer nesse aparelho de som, não? Se ele não acordar, não o chame. E me deixe na sala, no meio do caminho, talvez assim ele perceba. Tire os meus sapatos, o tapete está tão limpo. O que você usou dessa vez? Pode ficar com eles e com todos os outros. Com as minhas roupas também. Ele seria capaz de embrulhá-las para presente. Será que eu e ela usamos o mesmo tamanho? Não importa, eu também não gostaria de saber a resposta. Não, não se preocupe com a água oxigenada, eu não deixarei manchas de sangue dessa vez. Pensando melhor: cozinhe batatas.

domingo, 25 de dezembro de 2011

Um conto de bacalhau

Depois dos quarenta, quem nunca usou óculos começa a sentir a necessidade de usá-los. Tudo o que está mais perto fica embaçado, como por exemplo o rosto dos seus filhos quando vai beijá-los ou as letras dos jornais e revistas que ficam bem menores. Sacanagem.
Portanto, quando este momento chegar, sempre - eu digo SEMPRE, vá ao supermercado com seus óculos.

Amigo secreto sorteado via internet - uma diversão! A sua sobrinha internética faz perguntas, responde e ri sozinha no grupo. Uma farra!

A lista de quem leva o que também já está pronta - a madrinha se encarrega das frutas, a Nonna leva o tender com purê de maçã, os amigos vão trazer o frango com as maravilhosas batatas, sua irmã e o filho chef de cozinha, as sobremesas. E você, o bacalhau. Ninguém pediu, você se ofereceu.

Chegou o Natal. Lista de supermercado em punho, as crianças te acompanham para a saga de fazer compras no dia 23 - uma cuida dos itens para o café da manhã (os primos sempre dormem em casa), outra vai cuidar dos petiscos e aperitivos. E você, como não poderia deixar de ser, vai cuidar dos itens para o bacalhau. E sem óculos.

Fase 1. Por mais de 24 horas o bacalhau fica de molho prá dessalgar. Várias trocas de água e a derradeira no leite. Isto eu já sabia. A novidade surgiu quando começou a luta para separar a pele. O que era isso? Puxa de um lado, passa faca afiadíssima de outro - e nada. Cavoca ali, levanta acolá e a pele resistindo. Você liga prá sua mãe, torcendo para que haja um método mais simples. Tem sim, comprar pronto ou congelado, sem pele e sem espinhas.  Piadinha mais fora de hora...

Terminada a fase 2, pele arrancada, na fase 3 descubro que, na vida de um chefe de cozinha a parte mais importante é o auxiliar de cozinha. Ele picada, descasca, lava, separa, coloca nas medidas certas - e provavelmente, também teria tirado a pele. Mas você não tem um auxiliar de cozinha.  Cebola, alho, tomates e ovos estão todos à sua espera. A azeitona portuguesa também. Como você foi sem óculos para o supermercado ela está... com CAROÇO! Qual a razão de escreverem com letras tão miúdas nas embalagens?
Cebola refogando no azeite  e o bacalhau acompanhando o cozimento, é hora de se dedicar às azeitonas... uma a uma... Incrível como podem ser tão diferentes uma das outras.  Algumas só de olhar, o caroço sai. Outras, você dá tres pulinhos e pede prá São Longuinho  te ajudar a encontrar uma maneira mais fácil de tirar esse caroço.  Suspira e pensa... ainda bem que vão mastigar mesmo, assim não percebem a diferença entre azeitona sem caroço e azeitona esmigalhada. Muitas ficaram esmigalhadas. E não tenho muita certeza se alguma azeitona foi para o lixo e o caroço para a panela...

Agora é só esperar. O tempo e o fogo baixo farão todo o resto. Satisfeita, sorrio - logo todos chegarão e o momento de partilhar um dos momentos mais amorosos do ano se aproxima. 

Torcer para o bacalhau não estar muito salgado...

quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

Eita 21 de dezembro

Acordei e já pensei, antes mesmo de colocar os pés no chão: 13 anos sem a companhia da minha amada amigairmã Vanessa. No dia 21 de dezembro de 1998 acordei com um telefonema do pai dela, que me disse assim: não, Lu, não está tudo bem, a Vã morreu. Coloquei o filme da nossa amizade para rodar, eu sozinha no meu cineminha particular, coração voando para a minha adolescência, quando toca o telefone: meu pai, tão cedo assim? É, ele e minha mãe não dormiram muito bem, ou nada bem, ele me disse. Seis rapazes armados invadiram a casa onde eles moram há mais de 30 anos, onde eu e meus irmãos crescemos na paz. Meu coração voltou, o filme acabou e eu fiquei assim, assim...triste? É, triste também.

domingo, 18 de dezembro de 2011

A dona do cachorrinho e os donos da verdade

Passei o final de semana pensando na mulher que espancou o cachorrinho de estimação até a morte na frente da filha. Não, eu não vi o vídeo, mas pelo relato das pessoas, parece que foi isso o que aconteceu. Não quis ver a filmagem para preservar meu coração e meu estômago que não andam lá muito fortes. É claro que só de imaginar já sofri e talvez se eu assistisse à gravação os fantasmas sumiriam da minha mente. Mas resolvi ficar com eles.

De qualquer forma, não foi exatamente sobre o fato que eu fiquei pensando, e sim sobre a reação que ele provocou nas pessoas em redes sociais.

Primeiro, que fique claro: respeito qualquer animal, especialmente cachorros. Já devo ter tirado uns vinte das ruas, dos quais uns dez ficaram na casa dos meus pais. Os outros foram para donos que eu escolhi após visitas e entrevistas. Portanto, não admito qualquer violência contra eles. Uma vez, é sério, briguei com um cara no meio da rua porque ele estava chutando um rato. É, um rato enorme e gordo.

Segundo, eu sou mãe e meu coração quebra quando eu penso nessa mulher batendo no cachorro na frente da sua criança. Não consigo dimensionar o estrago.

Terceiro, penso na pessoa que ficou filmando tudo isso. Na era das redes sociais onde o que mais vemos são frases de outros copiadas e coladas à exaustão, penso naquela do Martin Luther King: “o que me preocupa é o silêncio dos bons.”

Mas, eu pensei em outra coisa. Uma coisa que foi a que mais me chocou e que me tirou o sossego até agora: a reação das pessoas no Facebook, única rede social que frequento.

Na verdade, quando li a notícia, a primeira coisa que pensei foi: coitada dessa mulher descontrolada! Eu não sei se alguém que me lê já chegou no fundo do poço. Eu acho que já cheguei. Minha terapeuta afirma que eu já cheguei. E quem já esteve no fundo do poço sabe do que um ser humano é capaz. Não, nunca espanquei cachorrinhos nem baratas nem crianças nem nada. Mas talvez não o tenha feito porque busquei ajuda e encontrei.

Mas também pode ser que a mulher não esteja doente e seja, sim, má. Claro, porque a maldade existe. E a sociedade tenta cuidar de uma coisa e punir outra. Ou pune as duas e não cuida de ninguém.

E seja lá o que for, o que eu sei é que eu não sei o que é. Não a conheço, nunca vivi com ela nem na casa daquela família. E milhares de pessoas que também não a conhecem e lá nunca viveram saíram pelas redes sociais pedindo sua morte, mostrando fotos de rottweilers e pit bulls, sugerindo que ela agredisse cães dessas raças.

Não estou defendendo essa mulher, mesmo porque não tenho procuração para isso. Mas também resolvi não atacá-la. Confesso que senti mais medo das pessoas reativas em rede do que saber que essa desequilibrada ou essa maldosa cuida de uma criança. A imagem que me veio à cabeça foi das cidades se iluminando pelo mundo, aquelas apresentações que a gente recebe pela Internet, mas ao contrário: uma sombra contaminando as pessoas e o mundo se apagando. As pessoas em rede podem tanto uma coisa quanto outra. Nesse caso, acho que escolheram a sombra.

O mesmo aconteceu há alguns meses no caso dos estudantes que tomaram a reitoria da USP. Não estudo lá. Conheço quem estude e trabalhe na universidade e mesmo essas pessoas não souberam me explicar bem o que estava acontecendo. Eu não acreditava que centenas de estudantes tomariam a reitoria porque uns quatro ou seis ou oito foram levados pela polícia por estarem fumando maconha. Devia ter alguma coisa a mais e alguns amigos me indicaram uns artigos que explicavam a situação com um pouco mais de detalhes. Novamente, não defendo esses estudantes, mas também não concordo com a “borrachada neles” que mais uma vez os facebookianos colavam nos seus murais. Dos que defendiam a “borrachada” ou a “porrada” nos “vagabundos”, nenhum soube me explicar com clareza e imparcialidade o que estava acontecendo.

Eu fico com muito medo. Sem exagero. E se essas pessoas estivessem unidas fisicamente ao invés de virtualmente? Veríamos o que vemos com as grandes torcidas em jogos de futebol. Ou um linchamento. Só porque é virtual pode? Será que as pessoas estão se dando conta de que entraram numa massa? Se sim e escolheram esse caminho, aceito. O problema é que a maioria deve acreditar que está agindo na individualidade em prol da bondade. Todos nos tornamos juízes e aplicamos penas de morte sem julgamento sério e digno.

Precisamos nos expor com mais calma e cautela. E sobretudo com conhecimento. Muita maldade também já foi feita em nome do bem.

sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

O fim

Muitas festas. Algumas com pessoas que a gente vê sempre e outras com pessoas que precisariam de um crachá com nome e procedência, o que não significa que seja ruim para uma pessoa nostálgica como eu.

Pessoas de longe que sei que estão perto, mas não consigo encontrar. Pessoas que amo. Para sempre, eu sei que para sempre.

Prazos. Artigos que escrevi e gostei. Artigos que escrevi e detestei. Trabalhos que preciso, mas não quero pegar. Trabalhos que quero pegar e não consigo.

Dois dias no interior. A cidade em que cresci mudou, mas ainda escuto as risadas que dei por lá e sinto o cheiro da alegria e da paixão. Dois dias presa nas minhas lembranças. Felizes. Como eu já fui feliz nessa vida.

O trânsito na capital. O mau-humor das pessoas que eu tento passar longe, bem longe.

Vídeos na Internet sobre mulheres que matam cachorros e assaltantes que arrancam orelhas de suas vítimas. Ei, eu não quero saber do mal. Mande-me palavras lindas juntas numa frase. Uma foto bonita com alguém sorrindo. E se estiver chorando, que seja de muita felicidade.

O fim do ano. Às vezes parece o fim do mundo. Até lá, que a vida possa ser tão intensa quanto foi essa semana que também está no fim.

sábado, 10 de dezembro de 2011

Obs

Quando a primeira palavra que sai da boca do seu filho é ALEGRIA, seu coração de mãe explode em milhares de estrelas.

quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

Loucura

Os prazos estão terminando, a meta próxima de ser alcançada e a pressão é assustadora. Restam dez dias úteis. Tempo é dinheiro. Dinheiro é dezembro.
Em dezembro, procura-se resolver a vida não vivida nos últimos onze meses. Caca Rosset tuitou que é neste mes que sabemos que o ano não vai dar certo...
Ela se encosta no parapeito da janela e solta os filhos para que voem pelos quatro andares que os separam do chão. O major, durante um sequestro relâmpago, perde a vida cumprindo sua função pois se esqueceu do colete a prova de balas. Alguns boletins que chegam trazem em si o espirito vermelho do Natal. Déficit nas notas e nas contas correntes. Bondade sendo praticada com sacolas de todos os tipos e tamanhos, deixando a reciclagem de lado. Pobres sacolas plásticas, foram as culpadas pela poluição do meio ambiente e hoje observam suas primas de papel rodando livremente pela cidade. Desafetos em "festinhas de firma" trocam anonimamente presentes que em sorteios os fizeram amigos. O compromisso das dez e trinta começa na realidade às oito para que seja cumprido no horário - pode começar antes, se o trajeto prevê algum shopping center no meio do caminho. Esta é a pedra de todos nesta época do ano. O casamento que se arrasta tem seu decreto definitivo, mas não final. É pau, é pedra, é o fim deste caminho. A ser efetivado em janeiro, para não traumatizar o Natal das crianças.

A partir das quatro horas da tarde, no decimo sexto andar de um prédio no Itaim, um espetáculo de verão tem início.
Vinte, trinta ou quarenta andorinhas bailam pelo céu, todos os dias até o final do verão.
Cantam, alegres, rodopiam em um bailado encantador.
É Natal.

quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Exercicio Marcelino

Queridos, o texto exercicio da oficina do Marcelino, optei por postar no meu blog - se quiserem fazer uma visita, sigam o link!
http://letrajuntojuntatudo.blogspot.com/2011/12/desfecho-unico.html

Pacto por água abaixo todos os dias

Quase todos os dias eu combino comigo mesma que não vou mais me assustar com o ser humano que já provou ser capaz das mais belas bondades e das mais terríveis crueldades. Acho que eu tento eliminar a emoção que faz com que eu viva quase vinte e quatro horas numa montanha-russa. É lugar-comum, eu sei, mas é perfeito: tem o trecho plano em que você consegue até apreciar a paisagem, uma subida que parece eterna e não te deixa ver nada do que acontecerá lá na frente, uma descida desenfreada, uma ou duas voltas em que viramos de cabeça pra baixo, umas voltinhas mais lentas para recuperarmos o fôlego e um fim que pode ser acompanhado de risadas ou de vômitos.

Todo dia eu falho.

Hoje foi com a notícia de que a polícia chinesa encontrou 180 crianças sequestradas para tráfico.

terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Alguém falou em culpa?

A babá já deixou claro que ela não ganha para acordar à noite e como você não encontra outra para substituí-la, aguenta. Mas essa noite você está sozinha: você e as crianças. E antes de se recolher, pontualmente às nove da noite, a babá avisa que amanhã de manhã irá ao médico. Ah, claro, último dia de aula do seu mestrado e no escritório um monte de coisas te esperando, mas tudo bem, você corre o risco de ser tão grossa e estúpida com a babá – você sabe do que é capaz nesses momentos, que engole seco e pensa que amanhã você vê como se vira.

Aí você tenta fazer uma criança dormir das nove às onze da noite. Duas horas com ela virando de um lado pro outro e te chamando e resmungando e pedindo peta e tetê e mãe vem aqui e você com calma pedindo para ela dormir até que chega ao limite e a manda fechar esses olhos e calar a boca. Ufa. Deita às onze mas meia-noite a outra chora porque quer porque quer a mamadeira e você dá. Coloca-a de volta no berço uma da manhã e a outra começa a choramingar. Você larga as duas no quarto e tenta dormir, mas aqueles resmungos não deixam. Solta um shhhhhhiiiiiiiiiiiiiiii bem alto e todos calam. Até às três. Acessa o Facebook conta até mil reza mesmo sem saber pede ajuda aos anjos mas às cinco entra no quarto e dá um berro. Um belíssimo calem a boca. Volta para a cama e pensa se vai tomar raticida ou enfiar a cabeça no forno de tanto remorso. Tem vontade de trazer as duas crianças para a sua cama e chorar um Amazonas de arrependimento. Às seis as duas pulam na sua cama e você resolve rir. Até ver uma delas com os olhos inchados e vermelhos e ramelentos. O pediatra pode te atender às oito e meia. Dá tempo? Claro, são sete e meia, você está sozinha, mora longe do consultório, em São Paulo – mero detalhe, precisa se trocar, escovar os dentes - não pode esquecer de escovar os dentes, é mais importante do que pentear os cabelos, depois trocar as crianças, escovar os dentes delas – pelo menos só da que será examinada, para o pediatra não achar que você é tão relapsa. Você vai conseguir.

E chega no carro carregando as duas chorando – uma porque quer fechar a porta e chamar o elevador e abrir o elevador e apertar o botão da garagem e ir no colo e a outra...porque viu a mais velha chorando. E lembra que está só com uma cadeirinha no carro, a outra ficou no outro carro que está em outra garagem e que se dane é preciso ir, uma na cadeirinha e a outra presa ao cinto berrando porque quer a cadeirinha e você, mais uma vez, mais uma vez, berra. Berra não tem outra cadeirinha para o prédio inteiro ouvir.

E vai sofrendo, sorrindo e chorando, mas vai. Consegue chegar. O pediatra detecta uma otite na criança mais velha que pode estar até prejudicando a audição. Pelo menos não deve ter escutado meus berros, você diz. O médico ri. Você segura as lágrimas.

Agora só falta você encontrar a amiga que te lembra do quanto a bebê dela é calma porque ela a leva na yoga e na natação e na meditação e na massagem.

Não, por favor, hoje não.

segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

Manual

Compro celular novo. Leio o manual. Televisão? Idem. Relogio de parede? Também. Eu gosto de ler manuais. Pode até ser o da sua maquina de lavar roupa.
Produto de um lado, manual do outro, mexe aqui, vira acolá e... voilá! Como diria minha amiga R.D., fico toda pimpona depois que a traquitana está funcionando.
Nos remotos tempos de teste vocacional, do tipo "feito nas coxas", recebi um resultado sugerindo que eu trabalhasse com Organização e Métodos. Nem existe mais isso, trocaram de nome e, até eu enquanto escrevo isto, dou risada com a imagem de que eu pudesse organizar e dar método a alguma coisa... Pois sim! Para isso existem os manuais - que os outros escrevem e com os quais, me delicio.
Além da quantidade infinita de manuais, existem os livros que ensinam qualquer um a fazer qualquer coisa. Estes são bestsellers - podem conferir nas prateleiras da casa de minha mãe. Precisa trocar pia? Tem um livro prá isso. Consertar torneira. Tem, sim senhor. Chuveiro, porta, para organizar armários, prateleiras, gavetas, tirar manchas, etc, etc, etc Todos os assuntos nas prateleiras das Saraivas e Culturas da vida.
Há muito tempo, exatamente dezenove anos, tenho procurado um manual único - ninguém tem, todos procuram e alguns poucos são experts autodidatas na matéria.
Se voce que está lendo, souber de um exemplar, por favor, me empresta.
É o manual "Como ser uma boa mãe e abandonar o sentimento de culpa".
Eu juuuuuuuuuuro que leio rapidinho e devolvo. Prometo.

domingo, 4 de dezembro de 2011

O dia do Doutor

Eu sou uma corinthiana nada ortodoxa. Não sei a escalação e mal assisto aos jogos, mas eu sou corinthiana, filha de um corinthiano fundamentalista que nunca perdeu o bom humor por causa de um jogo perdido ou mal jogado. Para o meu pai, "basta ser corinthiano". Ou, nas palavras de Toquinho, "ser corinthiano é ir além de ser ou não ser o primeiro". E eu, sou corinthiana, lá do meu jeito, mas sou. Já fui algumas vezes no estádio - experiência das mais emocionantes, já gritei em vários jogos pela TV e já desfilei orgulhosa pela Gaviões. Não trocaria o Corinthians por nenhum outro time. É diferente. A paixão do corinthiano pelo seu time não é como a dos torcedores dos outros times. É visceral e incondicional. É bonita. É a mais bonita.

Hoje às seis da manhã, entre o consciente e o inconsciente, ouvi meu marido falar "o Sócrates morreu, seu pai vai ficar triste". Às nove eu levantei com aquela sensação de que tive um sonho sobre a morte do Sócrates, mas a notícia estava lá na tela do computador. Meu pai deve ter ficado triste, mas eu também. Eu me lembro dele jogando. Sei lá por qual razão eu gravei umas imagens dele no campo. Era uma época bacana. Aqueles magrelos jogando por pouco dinheiro. Era bonito. Era mais bonito.

Justo hoje. Justo hoje que o Corinthians disputa o título do campeonato brasileiro 2011. O título que quase saiu domingo passado, mas que agora eu entendi. Tinha que ficar ainda mais emocionante. E de emoção o corinthiano entende.

Vai ser uma festa, do jeito que o Magrão merece. Eu vou me juntar à torcida hoje. Hoje eu vou.

sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

Enquanto isso...

... na fila do caixa:
- Aí eu falei prá ele, tipo assim, meu, não vai falar nada!?
- E ele?
- Ah, com uma voz besta, falou.. desculpa...
- E você?
- Ah, eu falei "o que?"
- E ele?
- Ah, falou "já disse, to pedindo desculpa aí ô"...
- E você?
- Pô, quem pede desculpa desse jeito, meu? Cara ridículo... Aí eu falei...

...

... no elevador:
- Garanto, estamos alinhados. Dei uma dura no cara, enquadrei mermo.
- Tava na hora, prá ser sincero contigo cara, já tinha passado da hora...
- Eu sei, broder, eu sei... mas é complicado
- Cara, pode ser complicado, mas com a grana que tá rolando tem que descomplicar...
- É, eu sei... eu sei... tem que enquadrar... tem que enquadrar...

...

... na livraria:
- Nossa que bacana! O encontro deve ter sido demais!!
- ...
- Isso é super estimulante...
- ...
- AAHHHHHH NÃO A-CRE-DI-TOOOOOOO!!! Amore, tenho que desligar... eu pre-ci-so beijar e abraçar quem eu encontrei aqui!! Nooooooossa que saudade!!! Re, vou desligar, vou desligar... CARAAAAAAACA, eu tava pensando em você!

No meu café preferido

Eles estavam todos contentes com gorrinhos de Papai Noel e a cada um que entrava eles gritavam pra cozinha: suco de laranja gelado! macchiato médio! pão na chapa!

Resolvi sentar. Cappuccino médio e pão na chapa. Livro do Antonio Tabucchi no colo.

Alguém senta ao meu lado. Só vejo as mãos: levemente trêmulas, com a pele solta repleta de manchas cor de café com leite. Penso nos meus avós, um iugoslavo e outro filho de italianos. As lágrimas param na minha garganta. Sinto que vou me afogar.

A dona do café aparece e o meu vizinho se empluma todo e canta um perfeito Buon giorno, Signora!

As lágrimas se postam nos olhos, todas prontas para saltar. È la lingua più bella del mondo.

Elevador

Eu parei no térreo para deixar uma tupperware com chocottone para os seguranças do prédio. Quando voltei o elevador subiu, em vez de descer para garagem. Fiquei brava, um pouco irritada. Fiquei apertando inutilmente o botão do 2S até que o elevador parou no 9o andar. A mulher que entrou estava chorando. Limpou as lágrimas com discrição, talvez amaldiçoando minha presença dentro do elevador da mesma maneira como amaldiçoei a viagem até lá em cima. Era uma mulher bonita, talvez uns 40 anos. Lábios grossos, olhos amendoados. O cabelo preto e brilhante preso em um rabo de cavalo alto perfeito. Estava bem vestida, com uma calça jeans escura, escarpin preto e um lindo sueter argyle rosa. Ela apertou o 6o andar, e continuava passando os dedos sob os olhos, disfarçando as lágrimas. Imaginei que alguém devesse ter partido o coração da mulher. Imaginei que esse alguém morasse também no nosso prédio. E lembrei que a última coisa que queremos é uma testemunha de nossas lágrimas quando nosso coração despedaça. Pensei que no meio do silêncio daquele elevador iam duas mulheres de coração castigado, e quando o espaço é tão pequeno, parece que o mundo todo se resume apenas a isso. Pensei em como era injusto aquilo. Resolvi que não ia lavar minhas mãos. As lágrimas continuavam teimosas, são muito impertinentes quando querem. Eu não queria ser a garota que a viu chorar no elevador. Então eu falei. Abri minha boca e falei. "Lindo o seu suéter!". A mulher se espantou por um segundo, depois abaixou o rosto até o peito, meio que lembrando qual era mesmo o suéter que estava usando e... sorriu. "Ele é diferente, né!?". Acenei que sim. Era diferente. A mulher sorriu e soltou de leve, quase imperceptivelmente a respiração. Talvez por um segundo ela tenha se esquecido do coração partido. Talvez por um segundo ela tenha se lembrado de todas as coisas que ela era além daquilo. Talvez por um segundo ela tenha se lembrado do dia em que comprou o suéter, da lojista lhe apresentando opções, do momento da escolha. Talvez por um segundo ela tenha pensado como tinha feito a escolha certa ao se vestir pela manhã. E se lembrado de que ela era uma mulher bonita, interessante, sofisticada. Ou talvez nada disso tenha se passado para ela. Mas quando a mulher desceu no 6o andar, o sorriso continuava lá.

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

Sabe...

ele canta o Samba da Benção como se fosse o Vinícius e eu fico triste vendo que ele é quem não gostaria de ser.

Oi?

Chegou dezembro? Mês de festas, comilância, compras e decisões sobre quem vai pra onde? O que aconteceu com os outros onze meses do ano? Onde eu estava, fazendo o quê? Janeiro e fevereiro...ah, no meio de uma depressão pós-parto, deixa pra lá. Março consegui voltar pro trabalho. Abril e maio? Só lembro que no fim de maio fiz aniversário. Junho? Aniversário do meu filho. Julho? Definitivamente fugiu do meu calendário 2011. Agosto comecei um mestrado, mas quando fiz as provas? Setembro, outubro e novembro? Trabalho-estudo-crianças-crianças-estudo-trabalho. Tá, novembro acabou agora com a festa do meu outro filho. Disso eu lembro. E tudo aquilo que eu havia planejado para 2011?

Será que é mesmo culpa do tsunami?