domingo, 18 de dezembro de 2011

A dona do cachorrinho e os donos da verdade

Passei o final de semana pensando na mulher que espancou o cachorrinho de estimação até a morte na frente da filha. Não, eu não vi o vídeo, mas pelo relato das pessoas, parece que foi isso o que aconteceu. Não quis ver a filmagem para preservar meu coração e meu estômago que não andam lá muito fortes. É claro que só de imaginar já sofri e talvez se eu assistisse à gravação os fantasmas sumiriam da minha mente. Mas resolvi ficar com eles.

De qualquer forma, não foi exatamente sobre o fato que eu fiquei pensando, e sim sobre a reação que ele provocou nas pessoas em redes sociais.

Primeiro, que fique claro: respeito qualquer animal, especialmente cachorros. Já devo ter tirado uns vinte das ruas, dos quais uns dez ficaram na casa dos meus pais. Os outros foram para donos que eu escolhi após visitas e entrevistas. Portanto, não admito qualquer violência contra eles. Uma vez, é sério, briguei com um cara no meio da rua porque ele estava chutando um rato. É, um rato enorme e gordo.

Segundo, eu sou mãe e meu coração quebra quando eu penso nessa mulher batendo no cachorro na frente da sua criança. Não consigo dimensionar o estrago.

Terceiro, penso na pessoa que ficou filmando tudo isso. Na era das redes sociais onde o que mais vemos são frases de outros copiadas e coladas à exaustão, penso naquela do Martin Luther King: “o que me preocupa é o silêncio dos bons.”

Mas, eu pensei em outra coisa. Uma coisa que foi a que mais me chocou e que me tirou o sossego até agora: a reação das pessoas no Facebook, única rede social que frequento.

Na verdade, quando li a notícia, a primeira coisa que pensei foi: coitada dessa mulher descontrolada! Eu não sei se alguém que me lê já chegou no fundo do poço. Eu acho que já cheguei. Minha terapeuta afirma que eu já cheguei. E quem já esteve no fundo do poço sabe do que um ser humano é capaz. Não, nunca espanquei cachorrinhos nem baratas nem crianças nem nada. Mas talvez não o tenha feito porque busquei ajuda e encontrei.

Mas também pode ser que a mulher não esteja doente e seja, sim, má. Claro, porque a maldade existe. E a sociedade tenta cuidar de uma coisa e punir outra. Ou pune as duas e não cuida de ninguém.

E seja lá o que for, o que eu sei é que eu não sei o que é. Não a conheço, nunca vivi com ela nem na casa daquela família. E milhares de pessoas que também não a conhecem e lá nunca viveram saíram pelas redes sociais pedindo sua morte, mostrando fotos de rottweilers e pit bulls, sugerindo que ela agredisse cães dessas raças.

Não estou defendendo essa mulher, mesmo porque não tenho procuração para isso. Mas também resolvi não atacá-la. Confesso que senti mais medo das pessoas reativas em rede do que saber que essa desequilibrada ou essa maldosa cuida de uma criança. A imagem que me veio à cabeça foi das cidades se iluminando pelo mundo, aquelas apresentações que a gente recebe pela Internet, mas ao contrário: uma sombra contaminando as pessoas e o mundo se apagando. As pessoas em rede podem tanto uma coisa quanto outra. Nesse caso, acho que escolheram a sombra.

O mesmo aconteceu há alguns meses no caso dos estudantes que tomaram a reitoria da USP. Não estudo lá. Conheço quem estude e trabalhe na universidade e mesmo essas pessoas não souberam me explicar bem o que estava acontecendo. Eu não acreditava que centenas de estudantes tomariam a reitoria porque uns quatro ou seis ou oito foram levados pela polícia por estarem fumando maconha. Devia ter alguma coisa a mais e alguns amigos me indicaram uns artigos que explicavam a situação com um pouco mais de detalhes. Novamente, não defendo esses estudantes, mas também não concordo com a “borrachada neles” que mais uma vez os facebookianos colavam nos seus murais. Dos que defendiam a “borrachada” ou a “porrada” nos “vagabundos”, nenhum soube me explicar com clareza e imparcialidade o que estava acontecendo.

Eu fico com muito medo. Sem exagero. E se essas pessoas estivessem unidas fisicamente ao invés de virtualmente? Veríamos o que vemos com as grandes torcidas em jogos de futebol. Ou um linchamento. Só porque é virtual pode? Será que as pessoas estão se dando conta de que entraram numa massa? Se sim e escolheram esse caminho, aceito. O problema é que a maioria deve acreditar que está agindo na individualidade em prol da bondade. Todos nos tornamos juízes e aplicamos penas de morte sem julgamento sério e digno.

Precisamos nos expor com mais calma e cautela. E sobretudo com conhecimento. Muita maldade também já foi feita em nome do bem.

6 comentários:

  1. Por doença ou por maldade, nao importa. Na minha opiniao o importante agora é afastar essa criança deste ser.

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  2. Concordo com você, as pessoas tornam-se juizes da causa, sem saberem muito sobre a causa, justiça com as próprias mãos, isso é um perigo. Precisamos tomar cuidado com as opiniões na rede, pois poderemos ser a próxima vítima.

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  3. Lu, concordo muito! Pensei exatamente nisso quando o bombardeio de mensagens surgiram. Que medo de redes sociais!

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  4. Isso é reflexo de uma sociedade cansada da morosidade e incompetência da justiça. Cansada da impunidade.Sabedora de que tudo vai acabar em nada, ou pizza! Chega uma hora, em que as pessoas acabam partindo para realizar essa justiça. E aí, realmente a coisa pega. As consequências são terríveis. Por exemplo, se a justiça funcionasse, essa mulher estaria presa por uns dias, cumpriria uma pena alternativa, estaria proibida de adotar animais e obrigada a passar por um tratamento psicológico. Como a justiça não funciona, o povo fez com que a vida dela seja destruida. Onde ela estiver, será perseguida e taxada de assassina.Ela acabou se tornando uma junção de todos os casos em que a justiça foi nula. O povo acabou canalizando nela tudo o que ficou engasgado por muito tempo. Um perigo isso. Que as autoridades deste país deveriam ter inteligência d reconhecer e tentar resolver.

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  5. Realmente caiu na rede pode ser para grandes vitórias ou derrotas. Seria construtivo se não houvesse violência nas palavras das pessoas e sim,um movimento de paz por um mundo melhor, com mais respeito, educação, e leis que realmente se cumpram. O silêncio gera omissão, mas palavras de violência, gera mais violência..Lincham nas redes socias com tanta violência, e esquecem tudo tão rápido, mudando para novos casos com rapidez, que agindo dessa forma, a força que as pessoas tem em mudar algo que não é saudável, acaba caindo no descrédito, as forças são perdidas....

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  6. concordo completamente com você!!! É por isso que tenho facebook mas nao uso muito. Tenho visto amigos colocar opinoes lá no muro (sobre qualquer uma coisa) que se tornao discussoes de varios dias com agravios e insultos de todas partes. Medo! è isso!
    valeria.

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